Brochura da exposição Cidade Real/Cidade Imaginária, Centro de Arte Infantil (desenho de Eduardo Miguel), Outubro 1985-Fevereiro 1986, Centro de Arte Infantil, ACARTE.
O CAI – Centro Artístico Infantil, também conhecido por “centrinho” é desde o início parte integrante do projecto de acção do Serviço ACARTE. Mais tarde, quando o ACARTE deixa de ter como directora Madalena Perdigão, acabará por ser integrado no Serviço de Pedagogia da Fundação Calouste Gulbenkian.
Dispondo muito embora de um espaço próprio, um pequeno pavilhão junto à entrada sueste do complexo Gulbenkian, e de uma coordenadora responsável, a Dr.ª Natália Pais, também Directora Adjunta do Serviço de Educação, com o qual, segundo afirmou[1], o orçamento do Centro de Arte Infantil seria partilhado, é importante entender a existência do centrinho enquanto inseparável do projecto do ACARTE como um todo e das já referidas experiências empreendidas pela Fundação em torno da Educação Artística, em particular.
Assim, antes de mais, o CAI era um espaço físico. Um edifício isolado do resto, num canto dos jardins, visto como coisa só para os miúdos, mais pequeno e mais informal. Uma grande montra dava a entender que se passavam coisas lá por dentro: a ludoteca, coisa rara no país, brinquedos, desenhos. À entrada, um vestíbulo para deixar sacos e casacos, semelhante aos que existem em creches. E deixar os sapatos, também. Depois, lá dentro, sobretudo roupas – adereços de teatro, que não eram só para as crianças. A ludoteca estava aberta todos os Verões.[2]
Mas, de facto, num olhar sobre CAI importa sublinhar o seu papel múltiplo. Ou seja, se por um lado o centrinho propõe actividades no local (permanentes e temporárias) a crianças e a escolas, constituindo-se como espaço à parte, desenhado à medida das crianças; por outro lado assume como tarefa permanente a disponibilização de formação a professores e técnicos que vão trabalhar por todo o país, muitas vezes em instituições que o centrinho visitará ou mesmo apoiará, como será o caso das ludotecas. Neste sentido, o trabalho do CAI, materializado muitas vezes em exposições com um tema central e várias ramificações, acabou por assumir um outro carácter, fundamental naqueles anos: a itinerância, ou a descentralização, que fez com que os painéis expositivos e parte das actividades propostas em torno de determinada exposição fossem levados pelo país fora, a convite de autarquias locais ou instituições de ensino.
Em entrevista, a antiga responsável Natália Pais lembrou que Maria Madelana Azeredo Perdigão era “defensora não só de promover espectáculos, mas defensora de formar professores, criar aulas e formar os professores na teoria e na prática e de a própria Fundação ter espaços onde as crianças pudessem também ter actividades, já que muitas nem sequer podiam tê-las nas escolas, sobretudo as que estavam no ensino público, relembrando o facto de já nos tempos do Serviço de Música haver uma atenção redobrada à formação e prática de formação de professores e crianças.
A Directora do CAI recorda igualmente que Madalena Perdigão “gostava muito de dar liberdade e autonomia às pessoas para que assumissem o máximo de responsabilidade. Isso sentia-se muito bem com o Centrinho. Às vezes eu ia propor-lhe coisas e ela dizia “ó Natália, a mim não precisa de me convencer. Faça.” Era preciso convencer os outros senhores do primeiro andar para darem os dinheiros.” E salienta ainda que a Directora do ACARTE “soube aproveitar o momento e o espaço e as potencialidades para fazer obra e para implementar aquilo em que acreditava. E soube se rodear das pessoas [certas]…” Sempre com o noção central que “não é só em adulto que se vai a um bom espectáculo ou que se faz um bom maestro; para ser um bom ouvinte ou um bom espectador ou um bom profissional é preciso desde pequenino ter o gérmen e estar sensibilizado e saber criticar e saber aprender”.
Sobre a equipa do CAI, Natália Pais explica: “O que nós tínhamos era colaboradores permanentes. Onde é que os fomos buscar? Os antigos professores dos cursos de Educação pela Arte [do Curso de Educação pela Arte que funcionou cerca de 10 anos no Conservatório Nacional]. Esses eram os colaboradores permanentes. E aí tivemos o cuidado de ir a essas pessoas, com currículos do mesmo peso: que era para o teatro não valer mais do que a música e a música não valer mais do que o teatro…”
Em relação à itinerância, característica central do Serviço explica que “autarquias e escolas (…) vinham à Fundação. Queriam abrir ateliers não sei para quê, querem abrir uma ludoteca com não-sei-quantos, pode ir aí um técnico fazer formação?… Fazíamos esse intercâmbio. (…) As nossas exposição geralmente iam itinerantes para a província, para as Escolas Superiores de Educação. E potencializavam-se muito as actividades do Centrinho através da expansão que tinha por todo o país, o apoio que dávamos às entidades escolares, extra-escolares e culturais ligadas à infância. Era uma coisa em que lucravam os dois [as entidades e o Centrinho].”
Arriscando uma abordagem cronológica, poder-se-ia dizer:
1984 | O CAI foi inaugurado, com a exposição “Escrever-Comunicar”, e a presença da primeira-dama, Manuela Eanes. A exposição “Escrever-Comunicar” visava potenciar o contacto com a escrita.
1985 | O ano de 1985 no CAI já teve um número maior de actividades-âncora com três exposições: “Os bichos” (de Março a Junho), “Coisas que as crianças guardam” (no mês de Junho) e “Cidade real – Cidade imaginária” (de Outubro desse ano a Fevereiro de 1986). No ano de 1985 mais de doze mil crianças participaram nas exposições, ludoteca, ateliês abertos e espetáculos e mais de 2500 adultos estiveram envolvidos em ações de formação, informação e em visitas familiares ou de outro carácter (Relatório FCG, 1985; Relatório FCG, 1986 apud).
1986 | Em 1986 as exposições propostas foram “As flores” (de Março a Junho) e “O som e o silêncio” (de Novembro 1986 a Fevereiro 1987).
1987 | Já o ano de 1987 foi dedicado aos dias festivos do ciclo anual, tanto pagão como religioso, com “As festas” (de Março a Junho) e um conjunto de actividades sobre “Os sentidos” (de Novembro de 1987 a Fevereiro de 1988).
1988 | “O índio, a natureza e a vida” (de Abril a Julho) foi o tema da primeira exposição de 1988. “Contar, medir e pesar” (de Novembro de 1988 a Março de 1989) foi a mostra seguinte.
1989 | O ano de 1989 foi reduzido ao ciclo “Brincar através da pintura” (de Abril a Setembro).
1990 | “Imagens e personagens do conto e da aventura” (de Março a Junho) foi a exposição apresentada em 1990.
1991 | “A aventura do corpo: no tempo e no espaço” (de janeiro a Junho).
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[1] Entrevista a Natália Pais realizada a 11-07-11.
[2] A existência de um espaço para crianças na Fundação não seria, porém, uma novidade, tendo anteriormente funcionado “nuns barracões nos jardins” e, anteriormente ainda, nos serviços onde a Fundação funcionaria antes da inauguração da sua sede, como dá conta Natália Pais em entrevista, acrescentando pormenores à história da colaboração entre o Serviço de Música e o Centro de Investigação Pedagógica.