Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte – ACARTE. Direcção de Madalena Perdigão.
1989
O ano de 1989 começou com uma mostra de dança portuguesa contemporânea, iniciativa que alguns anos antes seria dificilmente pensável, mas que, no seguimento das várias mostras de dança apresentadas pelo ACARTE e da vitalidade que esta área começou a ter, se revelou particularmente relevante. E, de facto, muito embora algumas vozes críticas considerassem ainda um ‘risco’ o Serviço ACARTE, da Fundação Calouste Gulbenkian, apostar assim em “quem ainda não deu provas das suas virtualidades” era já notória a necessidade de criação de espaços e de meios para o desenvolvimento daquela que parecia ser uma expressão com força no país. Reflectindo os esforços do Serviço na descentralização, a mostra teve uma extensão ao Porto, ao Teatro Carlos Alberto, e como esta outras iniciativas deste ano se desdobraram pelo território, tendo sido apresentada também em Coimbra, na BUC [Bienal Universitária de Coimbra], festival que teve uma importância capital na revelação dos coreógrafos que mais tarde fizeram parte do conjunto heteróclito que se agrupou sob a designação de Nova Dança Portuguesa, como se verá em pormenor no epílogo.
Em Fevereiro, a performance-arte, que em 1987 e 1988 tinha estado ausente da programação do ACARTE, regressou em jeito de tributo, apresentada num Ciclo de Arte Experimental em homenagem a Ernesto de Sousa, entretanto falecido. O ciclo contou com a presença de alguns dos nomes que marcaram os primeiros anos de actividade do ACARTE. O mês continuou com música: Vertentes de Teatro Musical, um ciclo que agrupou a colaboração entre Pedro Calapez e Mário Vieira de Almeida, e a experimentação de Constança Capdeville e Manuel Cintra levada a cabo nos Cursos O Teatro Musical e o Intérprete Hoje; e o ciclo Vozes do Mundo, desta feita com sonoridades da Tailândia e da Mauritânia.
O teatro regressou em Março, com Zone, de Guillaume Apollinaire, e em Abril com Doublages, de Jean-Paul Wenzel. A reflexão e o debate reapareceram com um ciclo que teve forte repercussão pública: O Sagrado e as Culturas.
Continuaram as apresentações bimestrais do Jornal Falado de Actualidade Literária, pelo PENCLUBE português. Em Abril as marionetas regressaram ao ACARTE, com apresentações radicalmente distintas entre si, e em Maio teve lugar a terceira edição do ciclo Aspectos da Dança Contemporânea, desta feita com foco na América do Norte. A crítica dava então conta de um “corpo que agindo é mais corpo” e “se gere hoje por outras normas” transformando “o que antes era libertinagem em libertário” .
Em Junho, o ACARTE acolheu o colóquio Operações do Gosto, onde a proposta, vinda da parte do sociólogo e agente cultural Orlando Garcia, numa altura em que a Sociologia da Cultura estava a dar os primeiros passos no país, implicou um exercício de reflexão interna. Até que ponto instituições como o ACARTE, o ARCO, o Centro Nacional de Cultura ou a Cooperativa Árvore se poderiam considerar como tendo contribuído para uma alteração do “gosto” nacional – ou, estendendo a reflexão desenvolvida nos capítulos anteriores e aplicando-a – de que forma teriam estas instituições contribuído para a formação do tal “povo pop” de que dá conta Rui Bebiano?
A iniciativa contou com a participação de uma série de nomes da critica especializada e mediática que estavam a emergir por estes anos.
A esta iniciativa, depois da habitual Festa da Música Europeia, seguiram-se os Encontros Luso-Americanos sobre Arte Contemporânea, no âmbito dos quais o ACARTE organizou uma série de concorridas sessões de vídeo e cinema drive in, em que foram discutidos temas fracturantes da década, como a SIDA. O mês seguinte arrancou com a IV edição da Dança no Anfiteatro.
Se Agosto era cada vez mais o mês de Jazz em Agosto, Setembro foi o mês dos mais densos e intensos Encontros ACARTE da Direcção de Madalena Perdigão e os últimos que co-programou com George Brugmans – já sem Roberto Cimetta, entretanto falecido, pois também Madalena Perdigão haveria de falecer pouco depois. Esta edição trouxe finalmente a Portugal Pina Bausch e Tadeusz Kantor, nomes maiores da cena mundial, há muito aguardados, juntamente com propostas emergentes e experimentais como era já apanágio da iniciativa. A imprensa multiplicou as reportagens, críticas e acompanhou de perto as propostas que estiveram frequentemente lotadas. E isso mesmo quando algumas das propostas apresentadas não eram do agrado pessoal deste ou de aquele crítico especializado.
A comemoração do Dia da Música com um espectáculo dedicado a Erik Satie e o colóquio O Judaísmo na Cultura Ocidental, incluindo a estreia da peça “O Contrabaixo”, marcaram o mês de Outubro.
A Dança continuou em Novembro, com a apresentação de Solos para Nijinski, onde a jovem bailarina do Ballet Gulbenkian Vera Mantero apresentou o solo Uma Rosa de Músculos, e o mês avançou com o Colóquio Luso-Espanhol de Arte Contemporânea, ao que se seguiu a Mostra de Dança Espanhola Contemporânea. Madalena Perdigão falecerá por esta altura, sendo interrompida a Mostra por alguns dias. O ano terminou com mais uma edição de Dezembro Infantil, apresentando teatro para crianças, com a presença do Black Lantern Theater.