Sobre
Em colaboração com o Serviço de Belas Artes e a propósito do V centenário dos Descobrimentos Portugueses Carlos Avilez leva à cena “Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente” de Natália Correia. Escreve Madalena Perdigão a este respeito:
ERROS MEUS, MÁ FORTUNA, AMOR ARDENTE,
Carlos Avilez
O prazer de dar vida a uma obra de arte.
O prazer de dar voz a um autor.
A alegria de propiciar a um encenador, a um artista plástico, a um musico, a um iluminador, a um grupo de actores, a oportunidade de criarem essa obra de arte,
de fazerem brotar essa voz. o orgulho de ver tratado urm belo tema português, de saber que se vão evocar Camões e o seu tempo. A satisfação de compartilhar com o publico tal prazer, tal alegria, um tão alto orgulho. A cumplicidade do ACARTE na apresentação de ERROS MEUS, MÁ FORTUNA, AMOR ARDENTE, de Natália Correia, feita dessa mescla de sentimentos, que faz esquecer todos os riscos e a aventura dum feito assim.
M.M.A.P.,
Lisboa, 6 de Outubro de 1988.
E na imprensa pode ler-se:
/…/ em (nossa perdição) se conjugaram /…/
com o perdão do Poeta, mas é epígrafe que apetece a este espectáculo de onde ressalta uma tal coerência desastrosa, que se não pode imediatamente decidir se é o texto de Natália Correia que gera a prolixidade clichética da encenação se vice-versa!
Uma coisa é, porém, tristemente certa: a peça não se aguenta na fragilidade da sua estrutura dramática fundada num exercício de verbo e colagem de poemas camonianos, a encenação escudou-se numa exercício semelhante de colagem de “ideias”, aliás reconhecíveis – curioso passatempo será o de propor às várias gerações o reconhecimento dos espectáculos que aqui se autocitam -, com o que Carlos Avilez recuou vinte anos na sua produção. Os actores, com excepções pontuais que em nada modificam o conjunto, antes nele se afogando, estão perdidos e o difícil papel central, o Camões de Rogério Samora, cheio de “tremolos”, arroubos e histeria interpretativa, é dificilmente compreensível. (Expresso, 5-11-1988)
[…] ao contrário dos trabalhos que recentemente tem vindo a apresentar na sua companhia – O Teatro Experimental de Cascais – , onde, como em O Balcão, dá livre curso à forte tendência barroquizante do seu impulso artístico, Carlos Avilez não tem sido muito feliz nas suas excursões exteriores: nem nas Guerras de Alecrim e Manjerona, de António José da Silva, que dirigiu no Nacional, nem no Hamlet que fez no CAM, nem tão-pouco com estes Erros Meus, má Fortuna, Amor Ardente, de Natália Correia, com o qual regressa à mesma sala. […] Pelo contrário, as longas três horas de Erros Meus… evidenciam, sobretudo, um ambíguo jogo de bons comportamentos, um desejo de institucionalização que se exprime através de formas e figuras de um forte convencionalismo, as quais só têm de aura clássica aquela (falsa) que nela descobrem os estereótipos do senso comum. […] o espectáculo em cena no CAM resvala frequentemente para a fatal armadilha da chamada cor local, a qual, como se sabe, pouco respeita a veracidade histórica e nada a veracidade poética; os figurinos concebidos por Emília Nadal não deixam de pesar nessa queda mortal. (José Valentim Lemos, Diário de Notícias, 8-11-1988)
Camões no ACARTE
[…] Uma ligeira pateada
Pela primeira vez, assisti nesta sala a uma pateada, embora ligeira. Tendo isto acontecido numa antestreia, o que pressupõe convidados “di qualità”, o facto é perturbador. Também vi pessoas a dormir e a sair a meio. O espectáculo começou às 9.20 e acabou às 1.40, o que é um verdadeiro desatino. […] O espectáculo necessita de vários cortes. Não só porque é desmesuradamente comprido como repetitivo. Com estes cortes, o espectáculo terá grande valor pedagógico, sendo uma boa propedêutica sobre Camões e o seu tempo.” (Manuel Rio-Carvalho, Jornal de Letras, 8-11-1988)
Num espectáculo mastodôntico é muito belo o cenário de Emília Nadal, cheio de elementos decorativos e arquitectónicos da época com figurinos da época que sugerem mais do que reproduzem. (Tito Lívio, A Capital, 10-11-1988)
Peça de Natália Correia põe quinze jovens no palco
[…] “Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente”, sobre a vida de Camões, numa encenação de Carlos Avilez, tem um elenco de mais de trinta actores, dos quais cerca de metade pisam o palco há pouco tempo, sendo esta a primeira ou uma das suas primeiras actuações. Dada a escassez de oportunidades que os jovens têm no nosso país de começar uma carreira tão dura como é a do teatro, esta ambiciosa aposta estaria já justificada por este factor. (Manuel Cintra, Semanário, “Festival de Outono segue e soma”, 5-11-1988)
“Nós portugueses temos um fraquinho pela lenda de Camões. Do Camões que, por ser pinga-amor e amar esta e mais aquela, acabou por ser excluído da corte e por ter a vida desgraçada que se sabe. Do Camões zarolho que, por namorar a Real Infanta, foi castigado com uma guia-de-marcha para a guerra de África onde perdeu o olho direito. Do Camões que amava esta, mais aquela, a princesa e a escrava, e que a todas era infiel, trocando-as de boamente pelas rameiras das tabernas de Lisboa. […] Creio não estar a dar à autora nenhuma novidade se escrever que a peça é muito longa, chata e enfadonha. […] Em resumo: há nas quatro horas do espectáculo uma boa hora de teatro. É pouco? É muito? Numa escala de quatro estrelas, demos-lhe uma. E acabemos aqui. (Manuel João Gomes, Europeu, 15-11-1988)
“A corajosa apresentação de peças difíceis tem distinguido a actividade do ACARTE, dirigido pela Dr.ª MAP. A apresentação de “Erros Meus, Má Fortuna, Amor Ardente”, de Natália Correia, inscreve-se nesta linha…embora o resultado neste caso seja discutível. […] Para a Gulbenkian, os nossos parabéns. Uma instituição desta natureza é tão útil quando revela obras-primas como quando denuncia as ciladas a que a ignorância pretensiosa pode conduzir. (J.H.S., Diário Popular, 28-10-1988)