Sobre

Em 1989, cinco anos passados desde a inauguração do ACARTE, parece poder já dizer-se que a sua acção formou público e artistas portugueses, alterando eventualmente o “gosto” dos portugueses, ou pelo menos dos Lisboetas. A conferência “Operações do Gosto” organizada por Orlando Garcia constituiu-se como momento privilegiado para discutir os impactos da actividade de instituições como o ACARTE, o Ar.co, a Cooperativa Árvore, o Centro Nacional de Cultura, o Fórum-Viseu e a Casa de Serralves.

Escrevem Madalena Perdigão e Orlando Garcia no programa da iniciativa:

 

A política cultural do ACARTE tem sido norteada por critérios de inovação e de experimentalismo, não como objectivos em si mesmos, mas como meios de intervir
na evolução e no desenvolvimento da vida cultural portuguesa. O propósito de fornecer aos nossos artistas, aos nossos críticos e ao nosso publico “informação” vasta e diversificada do que se passa de mais actual no estrangeiro, aliado ao desejo de favorecer a criação artística nacional, podem apontar-se como dois vectores constantes e característicos da programação do Serviço. Talvez por que esta dimensão fazia falta – ou melhor, era insuficiente – no panorama cultural português, as actividades do ACARTE tem obtido reacção favorável por parte do publico e dos meios de comunicação social. Pode mesmo afirmar-se que se criou um núcleo de frequentadores (80% dos quais jovens), que anteriormente não era atraído por manifestações deste tipo. Se a actuação do ACARTE, ao longo dos seus cinco anos de existência, modificou ou não o gosto dos portugueses, é interrogação que se coloca é será debatida numa das sessões deste Colóquio. A mesma questão será certamente também levantada pelo que respeita a intervenção de outros operadores do gosto no nosso meio cultural, como o Centro Nacional de Cultura, o Forúm-Viseu, a Casa de Serralves, a Cooperativa Arvore e 0 AR.CO. Mais haverá, sem duvida, em Portugal, mas a eventual injustiça da selecção agora efectuada poderá ser corrigida a seu tempo. Ao Dr. Orlando Garcia, proponente e coordenador do Colóquio, os nossos agradecimentos pelo seu valioso trabalho de base.
Que as reflexões, debates, encontros, discussões, que bem vindas polémicas suscitem as OPERAÇÕES DO GOSTO, para um melhor conhecimento do que É e do que pode vir a ser a vida cultural portuguesa. Oxalá!

 

Maio de 1989
Maria Madalena de Azeredo Perdigão
Directora do Serviço ACARTE

 

 

O objectivo é o da realização de um programa em que se exponham e debatam experiencias de intervenção no campo da Acção Cultural ligadas à Criação Artística
em Portugal e em diferentes níveis de actuação e que supostamente estejam a contribuir para “modelagens” ou “re-modelagens” do gosto de públicos específicos.
Tratar-se-á de uma abordagem exploratória num campo ainda muito pouco enunciado e interrogado em Portugal.

 

Orlando Garcia
Coordenador do Colóquio

 

E na imprensa pode ler-se:

 

“Operações do Gosto”: a terminologia tem um sabor curioso, misto de organicidade social na palavra “operações” e de racional aprisionamento de algo que é demasiado subjectivo e inter-subjectivo para ser consciencializado, o “gosto” precisamente.

Organizar um ciclo dedicado a tal tema, reunindo na Sala Polivalente do CAM os mais diversificados agentes culturais do País, é uma ideia peregrina e não podia sair de outra cabeça senão da de um sociólogo, no caso Orlando Garcia. De facto, só um membro da família poderia pensar nestas coisas como se se tratasse de uma relação de forças e de um tabuleiro com peças deslocáveis no caso o Centro Nacional de Cultura, o AR.CO, a cooperativa Árvore, o Fórum Viseu, a Casa de Serralves e o ACARTE da Gulbenkian, este o anfitrião de uma iniciativa que tenciona compensar a ausência de atenções a isso que se chama de “sociologia do gosto”.

[…] Apesar de Orlando Garcia, personalidade destacada da Associação Portuguesa de Sociologia, se interrogar sobre se “será possível reter ‘visibilidades’ no campo do gosto”, com um fenómeno ele concorda muito mais pacificamente: funcionam hoje organismos de cariz cultural, como os acima apontados, que vêm contribuindo ”para modelar ou remodelar o gosto” e isto num tempo em que assistimos a “comportamentos culturais segmentarizados”. Recorrendo à definição de Pierre Bourdieu sobre o que é o gosto (“a propensão ou aptidão para a apreensão de objectos culturais classificados ou classificantes”, dito numa linguagem tipicamente sociológica), Garcia sintetizou melhor as suas intenções e enalteceu o papel formador e informador das “agências de inovação cultural” enquanto fomentadoras de um “sistema de classificação” multiplicador das “capacidades de apreciar e diferenciar práticas e obras” e mesmo de sustentar “escolhas constitutivas de estilos de vida”. São os “mediadores-criadores”, como o sociólogo escolheu designar tais instituições, e a primeira a ser apresentada foi o Centro Nacional de Cultura, personalizado no CAM por Helena Vaz da Silva e outros elementos da sua direcção. Mas não sem que antes Orlando Garcia alertasse os presentes para um facto: se os anos 70 foram de “animação sociocultural”, presentemente a tarefa tem um sinal e objectivos diferentes, no sentido de uma “acção cultural” alimentadora de “disposições”, como caracterizou o sociólogo, numa só palavra, os resultados à vista. E não há dúvida que o Centro Nacional de Cultura tem cumprido um papel de realce a este nível, pelo que, preferindo substituir o discurso indirecto das palavras pelo directo das imagens, um vídeo foi passado para o ilustrar enquanto percurso de realizações. Foi assim lembrado que a Casada Comédia começou no CNC, que pouco depois do início da guerra, uma sessão presidida por Sousa Tavares denunciou a política governamental em vigor relativamente ao colonialismo […] Algumas das visitas e viagens culturais idealizadas pelo CNC mereceram assim uma referência […], com a alusão de Helena Vaz da Silva de que “a cultura é como o ar, respira-se”. […] Eram eles [os interpelantes] o geógrafo Jorge Gaspar e o director-adjunto de “O Independente”, Paulo Portas. Se o primeiro apontou na actividade do Centro uma irreprimível vontade de procurar ora “a cidade perdida” (com os “passeios de Domingo” por Lisboa, por exemplo) ora “a identidade perdida (uma viagem a Alcácer Quibir), considerando que viajar no passado tem um perigo, ser, o passado, “irrecuperável”, Paulo Portas foi mais longe e opinou que “o passado é apenas passado, tem um valor próprio, não leva a lado nenhum e muito menos ao futuro, pelo que é preciso ‘achá-lo’ e não ‘recuperá-lo’”. Jorge Gaspar também chamou a atenção para “o engano do tempo livre”, área de eleição das funções do CNC, e na medida em que hoje “serve para promover o consumo”. Na sua ideia é imprescindível “recriar a arte do lazer”. (Rui Eduardo Paes, Diário de Lisboa, 2-6-1989)

 

Numa Iniciativa do ACARTE, Operadores Culturais reunidos na Gulbenkian

[…] O ACARTE, promotor do colóquio, é talvez mais conhecido pelas iniciativas no campo do teatro, mas tem promovido paralelamente projectos multidisciplinares em que os diferentes temas são tratados sob os ângulos de diversas disciplinas como a música, a dança, poesia, cinema, artes plásticas e arquitectura.” (Diário Popular, 31-5-1989)

 

Ficha Técnica

Colóquio

OPERAÇÕES DO GOSTO

Sala Polivalente

SERVI~O DE ANIMAÇÃO, CRIAÇÃO ARTÍSTICA E EDUCAÇÃO PELA ARTE -ACARTE - COM A COLABORAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE SOCIOLOGIA

CENTRO NACIONAL DE CULTURA

APRESENTAÇÃO: HELENA VAZ DA SILVA, MARIA CALADO, FERNANDO BAPTISTA PEREIRA, ANA DUARTE

Interpelantes

JORGE GASPAR, PAULO PORTAS

AR.CO . CENTRO DE ARTE E COMUNICAÇÃO SOCIAL

APRESENTAÇÃO: MANUEL COSTA CABRAL, JOSE MOUGA

Interpelantes

IDALINA CONDE, ALEXANDRE MELO

ARVORE COOPERATIVA DE ACTIVIDADES ARTíSTICAS, CRL

APRESENTAÇÃO: HENRIQUE SILVA, EGIPTO GONÇALVES

Interpelantes

AUGUSTO SANTOS SILVA, JOAQUIM MATOS CHAVES

ÁREA URBANA/FÓRUM VISEU

APRESENTAÇÃO: RICARDO PAIS, ANTÓNIO SEQUEIRA LOPES, JOSE FERNANDES

Interpelantes

JOSE RIBEIRO DA FONTE, MANUEL MARIA CARRILHO

CASA DE SERRALVES

APRESENTAÇÃO: FERNANDO PERNES

Interpelantes

RUI MÁRIO GONÇALVES, JOSÉ LUIS PORFIRIO

ACARTE - SERVI~O DE ANIMAÇÂO, CRIAÇÂO ARTISTICA E EDUCAÇÃO PELA ARTE

APRESENTAÇÃO: MARIA MADALENA DE AZEREDO PERDIGÃO

Interpelantes

ADRIANO DUARTE RODRIGUES, JOSÉ BLANC DE PORTUGAL

Cada sessão consta de 2 Partes: Na primeira procede-se a apresentação de uma das experiências seleccionadas; Na segunda há lugar a um painel com interpelantes convidados e com representantes da experiência em loco.

Restaurante aberto para refeições ligeiras, das 17.30 as 21.30 horas

Vídeo apresentado por Madalena Perdigão no âmbito da conferência que profere sobre o ACARTE no Colóquio “Operações do Gosto” organizado por Orlando Garcia em 1989. Nele se dá conta do que foi a actividade do Serviço ACARTE entre 1984 e 1989.