Sobre

O interesse em divulgar a nova dança que na Europa está em expansão levou M.M.A.P a escrever uma carta a várias organizações europeias. Nesta, encontra-se bem manifesta a vontade de Perdigão em apresentar esta forma de arte no âmbito do ACARTE. A Mostra de Dança Holandesa será, eventualmente, um dos primeiros resultados sistemáticos deste esforço. E o primeiro de vários ciclos temáticos especialmente dedicados à nova dança, muitos deles com workshops e formações destinados a profissionais.

Diz Madalena Perdigão a este respeito, manifestando um desejo explícito por que esta forma de dança frutifique entre os portugueses:

 

“Nos últimos quinze anos a dança contemporânea, não-académica, teve um grande desenvolvimento na Holanda, originando a aparição de um número considerável de grupos de dança com concepções e estilos totalmente diferentes. O Serviço ACARTE, tendo conhecimento da inventiva e qualidade de muitos desses grupos, decidiu promover esta Mostra de Dança a fim de proporcionar ao público português um conhecimento do actual panorama da Dança Holandesa. Continuando a sua política de trazer ao conhecimento do público português formas mais inusitadas e mais experimentais da dança actual. vai o ACARTE apresentar em Lisboa uma série de espectáculos da dança holandesa. seguindo de perto o exemplo do Centro Georges Pompidou. que organizou um ciclo semelhante em Setembro de 1985, e de Reggio Emília, a chamada «capital» da dança cm Itália, que à dança holandesa dedicou primacialmente o seu Festival de Junho de 1986. Quatro pequenas Companhias estarão presentes na Sala Polivalente, duas mais aparentadas com as novas tecnologias, as outras duas seguidoras de tendências internacionais da dança. Todas de um grande nível técnico e artístico. Vêm demonstrar a alta qualidade atingida pela dança na Holanda, de que até há cerca de quinze anos apenas eram testemunho duas grandes Companhias. O público português conhece, aliás. dois ilustres coreógrafos destas Companhias – Hans van Manen e Jiri Kylian através de alguns bailados de sua autoria que constam do repertório do Ballet Gulbenkian. Mas além dos espectáculos, a Mostra de Dança Holandesa Contemporânea constará de sessões de vídeo, de uma exposição de fotografias de Hans van Manen (também reputado fotógrafo) e de dois workshops destinados a bailarinos profissionais, tudo contribuindo para um melhor conhecimento da dança holandesa em Portugal e para um alargamento dos nossos horizontes culturais. E bom será que o exemplo da Holanda – pais geograficamente pequeno, como o nosso é – frutifique entre nós, conduzindo à revelação de novos valores na dança e a uma salutar diversificação de estilos coreográficos com o denominador comum histórico cultural que lhes advirá da sua raiz portuguesa.
M. M. A, P.
Outubro de 1986”

 

 

E na imprensa pode ler-se:

 

“Novos Caminhos do Bailado Europeu

O ACARTE […], superior e inteligentemente dirigido por M.A.P., “continuando” a sua política de trazer ao conhecimento do público português formas mais inusitadas e mais experimentalistas da dança “actual”, acaba de levar a efeito, ao longo de duas semanas, uma “Mostra de Dança Holandesa Contemporânea” […]. Trata-se de uma iniciativa que se revestia do maior interesse e de grande importância, pois não só nos permite apreciar o actual desenvolvimento da dança na Holanda como também nos mostrou os novos caminhos que a dança percorre na Europa. Sobretudo, confirmou aquilo que já hoje é uma verdade mas que, entre nós, poucos sabem: que os EUA não são já a grande pátria da dança contemporânea e que é na Europa que se está experimentando e procurando novos caminhos no sentido do real impasse em que a modern dance caiu. […] Por outro lado, a Holanda – um pequeno país da Europa, tal como Portugal – poderá servir-nos de eloquente exemplo daquilo que, sem ponderação, boa organização e real apoio, é possível fazer no campo da arte e da cultura: hoje a Holanda possui 8 orquestras sinfónicas, 12 agrupamentos de música de câmara, 2 grandes companhias de dança e “ballet” e vários pequenos agrupamentos experimentais de dança subsidiados quer pelo estado quer por entidades autárquicas. […] Estamos seguros de que esta Mostra de Dança Holandesa Contemporânea irá ajudar os nossos jovens coreógrafos no que ela pode contribuir para o alargamento dos nossos horizontes culturais. […]” (Tomás Ribas, A Capital, 24-11-1986)

 

“A Mostra de Dança Holandesa Contemporânea  […] vem dar o exemplo de como por vezes correntes e escolas artísticas têm directamente a ver com a geografia. Não que se possa afirmar ser a dança holandesa algo de original (até pela ascendência que nela se revela da dança americana, desde o neoclassicismo de Balanchine ao pós-modernismo minimal de Lucinda Childs e ao universo multimédia de Meredith Monk, passando pelo modernismo vanguardista de Merce Cunningham e John Cage), mas porque as formulações conceptuais e práticas na Holanda globalizaram e deram sentido a um variado tipo de tendências que se encontram difusamente no bailado contemporâneo.

 

Da dança ao teatro coreográfico

[…] O espectáculo total: Não é por acaso que, em relação à dança holandesa contemporânea se prefere a designação de dança-teatro. É uma caracterização que diz respeito a praticamente todos os dançarinos holandeses, desde De Wit a Krisztina De Chatel: a dança enquanto teatro de expressão corporal, mesmo que abstracto. Em cerca de vinte anos, portanto, a Holanda evoluiu de um teatro de reportório para um teatro físico e visual, sem narratividade, diluindo-se as fronteiras entre dança e representação. Target, de Bart Stuyf, Bourrasque, de Nils Christe (Introdans) ou Typhoon de De Châtel são como que a extensão das implicações dinâmicas da “dança-contacto” do americano Steve Paxton – luta, competição, desafio, resistência – e do neo-expressionismo de Pina Baush. Pensando-se como um espectáculo total, este teatro coreográfico conjuga diferentes meios. Um dos elementos constituintes, a música, ganha um papel que em nada se confunde com o do bailado clássico. (Rui Eduardo Paes, Expresso, 8-11-1986)

 

“ […] A qualidade dos espectáculos apresentados é inegável. Mas antes de passarmos a uma análise detalhada de cada um, gostaríamos de fazer uma pequena reflexão. O Centro de Arte Moderna foi construído há bem pouco tempo. É um edifício amplo, arejado, versátil, integrado na paisagem… possui um único auditório, uma sala que pretende ser polivalente, mas que está em vias de ter que mudar de nome. Não é uma questão de maleabilidade, é uma questão de dimensão. Já ali estivemos sentados no “palco” para assistir a um espectáculo que exigia profundidade, ocupando a “plateia” e os corredores de acesso. Mas desta vez, um dos espectáculos, o de Introdans, precisava de mais espaço […]. quando já não há [lugares], [ o público vê-se obrigado] a aproveitar tudo quanto é degrau ou parede para se encaixar. É bom sinal, mas mau afinal. Será que não existe maneira de resolver o problema sem deixar ficar de fora os muitos interessados?” (Assis de Lima, O Dia, 27-11-1986)

 

“ […] A Mostra de Dança Holandesa Contemporânea foi, ainda, enriquecida pela realização de alguns “workshops”, de algumas sessões de vídeo e pela exposição de Hans Van Manen Dance Has Many Faces que nos permitiu apreciar as surpreendentes e muito belas fotografias do coreógrafo e mestre holandês Hans van Manen” (A Capital, 11-12-1986)