Sobre

Na imprensa pode ler-se:

Kafka por Corsetti
A cena passa-se nos jardins Gulbenkian, por detrás de uma vedação. Um pequeno grupo de rapazes e raparigas gesticula, parecendo à primeira vista tratar-se de uma aula de ginástica. Do lado de lá da vedação, alguns dos transeuntes param, espantados. Um ou outro decide meter conversa, perguntar do que se trata, e alguém lhe responde. […] Não, não é uma aula de ginástica. Um espectáculo está em preparação. Um espectáculo diferente, nada mais. […] Espectáculo inteiramente concebido por Corsetti, “DE NOITE”, baseado em textos de Kafka, é uma criação total, ou seja, todos os planos (encenação, cenografia, concepção) partem daquele director, sendo neste caso a encenação apoiado por Nuno Carinhas, a cenografia por Marta Wengorovious e a música por Carlos Zíngaro, que a interpretará ao vivo. A interpretação está a cargo de uma equipa de jovens resultantes de uma selecção feita pelo próprio Corsetti, jovens na quase totalidade em início de carreira […]. Assiste-se assim mais uma vez a um sintoma já presente em muitas formas de espectáculo (veja-se o caso do trabalho da companhia de Pina Baush) em que as fronteiras entre o teatro, a dança e a música ao vivo vão sendo esbatidas, convergindo numa forma artística que não será nova mas talvez inovadora, na medida em que pede aos seus intervenientes uma capacidade de actuação múltipla, como aliás acontece a nível de outras profissões: sabe-se que na Europa, neste momento, vários governos orientam o problema profissional e o do combate ao desemprego no sentido de propor, desde jovens, aos cidadãos que aprendam e se preparem a poder cumprir várias profissões ao longo da vida. O mesmo seria de desejar no nosso país, em que a alienação crescente coloca, cada vez mais, as pessoas em compartimentos estanques e linguagens diferentes, correspondendo obviamente a um isolamento e uma solidão igualmente crescentes e assustadores.” (Manuel Cintra, Semanário, 3-9-1988)

 

Resumamos os passos prévios que nos levaram a conversar. No ano passado Corsetti deu início aos Encontros Acarte com “O Ladrão de Almas”. As reacções foram muito boas e o êxito” justificou novo convite. Voltou. Mas voltou sem o grupo e formou através de audições prévias de candidatos um grupo constituído por jovens portugueses. […] Walter Benjamim, num texto sobre Kafka, diz que na escrita há um vocabulário de gestos que avançam paralelamente à própria escrita. Num pequeno gesto pode ler-se toda uma tragédia. A ideia, se bem entendo, é procurar o gesto, o movimento seminal de cada uma das pequenas histórias quase banais colhidas nos fragmentos do diário e nos “Cahiers en Octave”. O intuito não é fazer um belo espectáculo com o sonante nome de cartaz Franz Kafka mas sim “experimentar e descobrir novas linguagens”. – O teatro contemporâneo tal como eu o entendo não pode já ser um teatro de ilustração, um teatro quase milimétrico. Será um teatro que se pode chamar talvez mais abstracto. O percurso de Giorgio Barberio Corsetti explica melhor a razão de ser desta opção. Depois de ter feito em Roma o curso de História do Teatro e o curso da Academia Nacional de Arte Dramática, e como “não gostava do teatro convencional e sempre gostei muito da performance no teatro”, foi até Nova Iorque onde, nessa altura, fervilhava a experimentação e a busca de novas linguagens.  (Jornal de Letras, 6-9-1988)

 

Adiar a estreia de um espectáculo num festival como os Encontros ACARTE já não é sinal de boa saúde: mas mandar, na noite seguinte, o público de um lado para outro (e a distância não era tão pequena como isso, e fazer esperar esse mesmo público durante uma hora (marcado para as 21.30 o espectáculo começou às 22.30) é talvez mais grave em especial porque, como sempre, não houve uma palavra de atenção para esse público. A certa altura parecia que ia haver um motim no portão dos jardins da Gulbenkian. […] Devo dizer que o espectáculo venceu: Os Encontros estão perdoados. […] o espectáculo de Giorgio Barberio Corsetti propõe uma leitura possível de alguns de alguns dos fantasmas kafkianos. E o que começa por parecer ser um catálogo de efeitos cénicos improdutivos revela-se por fim como um mundo de angústias tornado mais terrível pelo aparente humor que o atravessa. […] Foi prodigioso o que Giorgio Barberio Corsetti conseguiu em tão pouco tempo com estes quatro actores e dois bailarinos portugueses quase sem experiência: os jogos corporais, os jogos acrobáticos (correndo as plataformas oscilantes, subindo os tubos como se fossem marinheiros, percorrendo o espaço presos a um fio como se fossem anjos, martirizando os corpos nas quedas constantes como kafka’s assustados com o incompreensível – como nunca se vê no nosso teatro. […] Domingo, 18.30, dezenas, centenas de espectadores apresentam-se para assistir, a maioria, ao espectáculo do grupo Plan K com o título “If Pyramids were Square”, os outros para participarem no encontro com Heiner Muller. O camião com o cenário dos belgas ficou retido em França (e que viva a CEE!), o dramaturgo ficou retido algures (e a Festa do “Avante!” Lá tão longe!). […]” (Carlos Porto, Diário de Lisboa, 12-9-1988)

Ficha Técnica

Espectáculo

GIORGIO BARBERIO CORSETTI

Colaboração

CATHERINE MCGILVRAY E DE NUNO CARINHAS

Organização e Versão dos Textos:

GIORGIO BARBERI CORSETTI, CATHERINE MCGILVRAY E NUNO CARINHAS

Traduções

JOÃO BARRENTO

Música

CARLOS ZÍNGARO

Desenho de Luzes

ORLANDO WORM

Projecto e Sonorização

JORGE GONÇALVES

Assistente de Cenografia

MARTA WENGOROVIUS

Com

AFONSO DE MELO, AGNELO DE ANDRADE, DUARTE BARRILARO RUAS, FILIPA MAYER, LUIS CASTRO, MARGARIDA MARINHO, TIAGO PORTEIRO