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O ano termina com um ciclo sobre Arte e Tecnologia, organizado por A.M.Nunes dos Santos. E, a propósito de O Lagarto de Âmbar, na imprensa discute-se o ‘multimédia’:

 

“Na Sala Polivalente do CAM estreou-se uma nova produção do ACARTE: O Lagarto do Âmbar, trabalho dirigido por Alberto Lopes a partir de um argumento de Maria Estela Guedes. Definido como espectáculo multimédia, tratar-se-ia de integrar “numa totalidade significante um conjunto de suportes díspares”, propondo “uma actualização da ideia de teatro, de um teatro próprio da época em que vivemos.”. A seu tempo, Wagner, prosseguindo a utopia de uma obra de arte total, Gesamtkunstwerk (esperemos que nenhuma gralha venha estropiar o texto) procurava no teatro a completa fusão das artes; pelo contrário, a vocação das experiências multimédia seria a de manter a autonomia e a especificidade de cada uma das linguagens chamadas a participar na criação do espectáculo: a intersecção dos diversos planos apelaria ao espectador como construtor de uma leitura pessoal, sempre provisória. Ao contrário do efeito wagneriano de acumulação, mesmo de saturação, o espectáculo funcionaria aqui através de efeitos minimais, discretos. Mas, paradoxalmente, a necessidade de manter a especificidade, mesmo a autonomia, de cada um dos componentes, exige um trabalho final de estrutura, de organização, extremamente atento, coerente, milimétrico. Foi o que desde logo me parece ter falhado no espectáculo em referência. […] O Lagarto do Âmbar parece-me assim um daqueles projectos em que a multiplicidade de ideias iniciais se dilui ou desarticula na realização cénica, deixando-nos uma perplexidade não produtiva: a aventura morre de tédio.” (José Valentim Lemos, Diário de Notícias, 19-1-1988)

 

“Algumas considerações suscitadas por “O Lagarto do Âmbar”, que acabo de ver na Sala Polivalente da ACARTE (FG). Primeira: o público português de Teatro é, por certo, o público mais masoquista do globo. Assiste até ao fim, paulatina e civilizadamente, a espectáculos incríveis e insuportáveis sem que um único espectador diga NÃO e saia automaticamente porta fora. […] Quarta: se o Teatro pós-modernista é isto, e vier a ser assim, adeus Teatro que eu me aparto de ti, divorciando-me de milénios de entendimento e de prazer. […] Ou seja, “O Lagarto do Âmbar” […] é uma mistificação, é um falso contributo, por exemplo, para o processo em curso que tem por objecto as sinapses possíveis entre o Teatro e o vídeo. […]” (Fernando Midões, Diário Popular, 27-1-1988)

 

“O espectáculo com que o ACARTE abre a sua temporada teatral enquadra-se nos objectivos de experimentação e questionação artística que são a natureza mesmo daquele serviço dirigido por Madalena Perdigão. (…) A verdade é que uma reflexão prévia está patente nos textos do programa (da autoria de A. Lopes e Maria Estela Guedes). Mas o produto redunda numa especulação fechada, de onde ressalta uma “pautação” técnica (e tecnológica “quantum satis”) que exclui a interacção criativa, selvagem, que no teatro escapa vitoriosamente à apropriação tecnológica e até sistematizante (que o digam os semioticistas!). O tempo é de repensar. Certo. Mas se ao actor, ao autor, ao encenador não cabe já o exclusivo da produção de sentido, a quem cabe agora? Ao somatório de habilidades tecnológicas? […]” (Eugénia Vasques, Expresso, 23-1-1988)

 

“Um espectáculo com uma história insólita – um aspirador quer ser humano e tanto se esforça que consegue – contada de uma forma também insólita – por actores e uma televisão que é também um personagem – estreou-se na FG, em Lisboa. Trata-se de “O Lagarto do Âmbar” e constitui uma inovação no que respeita a teatro pois, pela primeira vez, diferentes meios de comunicação intervêm não como cenário, mas como actores, dialogando com actores de carne e osso. […] Afirmando-se como uma pessoa “farta de rotinas, com um grande desejo de mudança”, nomeadamente de uma “mudança estética”, Maria Estela Guedes diz que a inspiração para “O Lagarto do Âmbar” lhe surgiu quando, há pouco tempo, comprou um aspirador. […]” (O Dia, 21-1-1988)

 

“[…] Sabemos que espectáculos como este são inevitáveis em períodos de mutações tecnológicas como o que vivemos. Pergunta-se, no entanto, será obrigatória a tecnologia matar a imaginação? Basta lembrarmo-nos de Almada. Por outras palavras, há incompatibilidade entre novo e talento? Mas o Conselho Consultivo do ACARTE, diz-se no programa, aprovou o projecto, isto é, entendeu que o ACARTE devia gastar dinheiro com isto, o ACARTE abriu os cordões à bolsa – e pronto. Eles é que sabem, não é?” (Carlos Porto, Diário de Lisboa, 21-1-1988)

O ano termina com um ciclo sobre Arte e Tecnologia, organizado por A.M.Nunes dos Santos.