sobre

O ciclo Dança no Anfiteatro IV é outro dos momentos em que Madalena Perdigão se regozija com a existência de uma renovação do interesse pela dança – renovação esta que relaciona com, entre outras motivações, “a existência de um novo público para a dança”, público esse “que se foi criando à medida que se multiplicavam os espectáculos, os workshops, os cursos, as escolas, atraído pela capacidade de comunicação viva e imediata da dança […] e também a primazia do corpo e da música moderna nas actuais tipologias desta arte.” É no âmbito de Dança no Anfiteatro IV que o segundo espectáculo da Companhia Rosas é apresentado. Escreve Madalena Perdigão:

 

Ao apostar na Dança como catalisador da comunicação entre o artista e o público, como factor de convivência numa sociedade que tanto dela carece, constitui uma característica constante dos objectivos e da programação do Acarte. O ecletismo da selecção das companhias, patente nos ciclos Dança no Anfiteatro, agora na sua quarta edição, mais do que nos outros ciclos de dança organizados pelo Serviço ACARTE, demonstra uma abertura intencional a diversas perspectivas estéticas, a variados estilos e géneros, que ao Público cabe julgar. o renovo de interesse pela dança que actualmente se verifica entre nos resulta de numerosas motivações, algumas das quais subtis e que podem passar despercebidas a olhos menos atentos. Entre estas motivações, sobressai a existência de um novo publico para a dança, que se foi criando a medida que se multiplicavam os espectáculos, os workshops, os cursos, as escolas, atraído pela capacidade de comunicação viva e imediata da dança, a que acima se aludiu e também a primazia do corpo e da musica moderna nas actuais tipologias desta arte. […]

 

Lisboa, 14 de Junho de 1989
M.M.A.P.”

 

Na imprensa podem ler-se críticas e comentários aos bailados de Karole Armitage, Companhia ROSAS e Companhia Nacional de Bailado:

 

Julho é mês de bailado. E para começar nada mais agradável do que bailado numa noite (de luar). (O Século, data não identificada, arquivo do ACARTE)

 

Um anfiteatro vazio o que sugere? Memórias…O anfiteatro ao ar livre da Gulbenkian vai sugerir, a partir de hoje, muito mais do que isso. O Ciclo Dança no Anfiteatro apresenta a Compagnie Rosas. (Diário de Notícias, 23-7-1989)

 

Este é um bailado feito de resquícios, de sobras e memórias. Primeiro que tudo das técnicas clássicas do bailado, ou melhor dizendo, do “ballet”, que é do que afinal se trata. Depois da música, com um Thelonious Monk arquétipo do jazz ou um Jimi Hendrix na matriz do rock. Ou ainda do cinema, mexendo evidentes citações de “Le Mèpris”, um velho filme de Godard. Karole Armitage, coreógrafa, bailarina, directora de grupo com a aura da nova geração da dança contemporânea, é uma manipuladora de passados, não uma nostálgica.  (Rui Eduardo Paes, Diário de Lisboa, 13-7-1989)

 

“De certo modo, é um pouco toda a dança americana que está presente nos espectáculos da companhia liderada por Karole Armitage. (João Botelho da Silva, Diário de Notícias, 19-7-1989)

 

Desde o espectáculo fabuloso dado em 1981 por Merce Cunningham e John Cage, que veio a provocar uma ruptura fundamental em tudo o que se vira até então, a cidade do Porto tem sido palco para excelentes companhias de bailado norte-americanas. (Carlos Saraiva Pinto, O Primeiro de Janeiro, 20-7-1989)

 

Obra-prima absoluta, ou pouco lhe falta…O espectáculo Ottone, Ottone da Companhia Rosas, dançado, interpretado, falado, sussurrado, interrompido, destruído, reconstruído, no Anfiteatro da Gulbenkian. Já pela segunda vez o Serviço Acarte chama a Lisboa essa coreógrafa de primeira linha, Anne Teresa de Keersmaeker. […] Ottone, Ottone, obra integral, com que Wagner sonhou. E nós sonhamos para as óperas de Wagner uma Companhia Rosas. Abaixo Beyreuth! (…) Se vais de férias, amigo, se procuras o merecido isolamento, somos milhares que vamo-nos encontrar. Por isso ainda espero, demoro, escrevo, não me encaminho.” (Jorge Listopad, Diário de Notícias, 3-8-1989)

 

A encerrar o quarto ciclo de Dança no Anfiteatro de Ar Livre teremos oportunidade de rever a Companhia Rosas, agrupamento belga cuja apresentação em Portugal em 1987 terá ficado marcada na memória dos então parcos frequentadores do ACARTE. Assistiu-se a um espectáculo sublime constituído numa única coreografia (Rosas danst Rosas) […]). Esta teatralização matemática [da interpretação] dever-se-á ao trabalho coreográfico de Anne-Teresa de Keersmaeker recoberto da dramaturgia a cargo de Marianne Van Keamkhoven. Foi esta mesma Van Kerkhoven que nas “Perspectivas de Dança Nos Finais Do Século XX” – congresso que em 1988 reuniu em Lisboa nomes importantes da dança europeia, sublinhava ser a nova dança belga sintetizadora das tradições francesa, russa e alemã, pela aproximação mútua da dança e do teatro, relação ocultada demasiado tempo por Maurice Béjart. (A.F., Expresso, 27-7-1989)

 

Rosas para Rosas
A primeira ambiguidade […] do espectáculo começa logo neste ponto, levando o público a perceber de imediato que a dança não presume uma ilustração do libreto de Monteverdi mas uma sua reinterpretação livre e segundo os conceitos contemporâneos, mais amorais ainda que o amoralismo do compositor italiano. Logo, são duas as situações que é necessário apreender, hierarquizando os níveis de ambas segundo a própria narrativa, o que, se pode ser um exercício curioso, não deixa de cansar um pouco. (Rui Eduardo Paes, Diário de Lisboa, 28-7-1989)

 

Sem imputar à mera coexistência de correntes estéticas o equívoco que gerou a reunião de companhias tão diversas como aquelas que nos foram dadas a ver no quarto ciclo de “Dança no Anfiteatro” de ar livre da Gulbenkian, assinale-se de início a fatal descontextualização cenográfica dos espectáculos […] Do teatro-dança é o público português ainda razoavelmente ignorante, personificando sobremaneira aquele género na figura de Pina Bausch.

(António Francisco, Expresso, 5-8-1989)

Ficha Técnica

Com:

KAROLE ARMITAGE BALLET

COMPANHIA NACIONAL DE BALLADO

COMPAGNIE ROSAS