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No programa da iniciativa Madalena Perdigão explica a sua pertinência:
Perguntar-se-á se se é mais português voltado para o interior, a procurar raízes e a fortificar fronteiras, ou aberto ao exterior, na expectativa duma chuva que poderá fertilizar o solo pátrio. O receio de Portugal perder a sua identidade cultural tem assaltado as mentes de tempos a tempos e o assunto volta à ribalta sempre que, como agora com a integração europeia, se concretiza uma abertura ao exterior. Receio infundado, afirma-o Jorge Borges de Macedo: Este alegado perigo para a identidade cultural
portuguesa assenta, afinal, num conceito superficial de cultura e na convicção de que a cultura portuguesa constitui um produto sucedâneo, criado à superfície do nosso corpo colectivo, sem continuidade nem correspondência com a sua exigência profunda e vivencial. Não é assim. Não se será menos português por querer dialogar com o mundo, por pretender conhecer o que os outros possuem de enriquecedor e por desejar dar em troca algo do que constitui a nossa diferença e a nossa riqueza. A perspectiva da integração europeia provocou o recomeço desse histórico movimento de vai-e-vem do qual decerto o país colherá importantes resultados. Bastaria o interesse pela cultura portuguesa que o nosso ingresso na Europa das Comunidades despertou nos restantes países para se poder considerar esse ingresso como um factor positivo. Interesse a que temos de corresponder desdobrando o tapete e ostentando os nossos produtos, quer em Portugal quer no estrangeiro, e talvez de preferência adentro a portas, para que esses produtos sejam vistos no seu enquadramento próprio, histórico, geográfico e social. Corresponderemos também a esse interesse retribuindo-o o com sentimento igual relativamente às culturas dos outros países da Comunidade. E estas são a história, a justificação, a perspectiva dos ENCONTROS ACARTE 87.
Que não escolheram o caminho seguro das estruturas tradicionais, mas sim um circuito inovador, com características de experimentalismo e apostando no futuro. Disciplina fundamental o Teatro, arte entre todas a mais ligada ao berço da Europa, irremediavelmente entrelaçada com a Dança, sua irmã. Depois a emoção, a alegria, a partilha. Os artistas e companhias estrangeiras trazem-nos tudo aquilo que Roberto Cimetta e Georges Brugmans tão bem definem no seu artigo publicado neste mesmo programa. A ambos os autores aproveito para agradecer a inestimável colaboração prestada à organização dos ENCONTROS. Por seu turno, os artistas portugueses vêm com os tesouros da nossa tradição, com o cheiro da terra, com a grantdeza d’alma das gentes. Baseados, o Teatro das Enormidades, em textos de sabor regionalista do grande escritor que foi Aquilino Ribeiro e o Montedemo numa novella de Hélia Correia, que tanto tem contribuído para rasgar novos caminhos à literatura portuguesa. Presos aos textos, portanto, mas ricos de sentido lúdico, os dois espectáculos indicam caminhos possíveis do teatro português. Portugueses também são todos os artistas que participam nos mini-concertos com que diariamente terminam os ENCONTROS. Aí, em ambiente informal de convívio, serão ouvidos o Fado, canção urbana de Lisboa; canções alentejanas do Sul de Portugal; música de Erik Satie e de Astor Piazzola; e canções de Paris. As conferências, as mesas-redondas, os encontros-diálogo dos artistas com o público, constituem outros tantos motivos de interesse dos ENCONTROS ACARTE 87 e permitirão uma reflexão aprofundada sobre o tema “O Teatro na Europa, Hoje». Hoje. E amanhã? Que futuro para o Teatro na Europa? O presente pode elucidar sobre o futuro. No teatro, como, em geral, em todos os domínios da cultura. Assim, a reacção positiva ou negativa que os ENCONTROS provocarem no meio artístico português constituirá um indício, embora mínimo, do que vai ser o nosso encaminhamento cultural. Sejamos então optimistas, como o é o nosso deputado ao Parlamento Europeu, Francisco Lucas Pires, ao pretender fazer de Lisboa, que é o maior expoente citadino daEuropa do Mar, uma das capitais da cultura europeia. Porque não tentar?
Estoril, Agosto de 1987,
Maria Madalena de Azeredo Perdigão
George Brugmans e Roberto Cimetta contextualizam a programação:
Durante as últimas décadas presenciámos o aparecimento ininterrupto de muitos grupos jovens do teatro e da dança europeus, desligados das formas de expressão mais tradicionais. É óbvio que isto se pode relacionar com o surgimento da nova cultura propriamente dita, com 1968, com o triunfo da música pop e com a expansão do video-clip. Mas também pode ser tomado como reacção ao desenvolvimento da cultura oficial, com a sua política de estimular o consumo, o seu sistema repressivo da tolerância verbal e o terror inaceitável pelos meios de a difundir. Para muitos esta época é de confusão. E cada vez mais a linguagem parece não dever ser acreditada como veículo de comunicação da realidade que nos circunda. Vivemos no meio de uma explosão contínua de imagens e é, agarrando-se a isto, que os jovens europeus que fazem teatro lutam pela aceitação de maneiras de se exprimir para além das verbais. Usam os seus corpos e as suas emoções, deixam-se inspirar por artistas de artes visuais, compositores e coreógrafos, para a partir daí criarem uma forma de teatro nova, muito contemporânea e cem por cento internacional. Tendo como ponto de apoio não a palavra mas a imagem, obtêm resultados espantosos na transmissão de significados.
O FESTIVAL ACARTE traz-nos de fora o fluxo mágico das imagens poéticas de Corsetti, o turbilhão estonteante dos mitos sensuais de Gallota e as confrontações desordenadas de Fura dei Baus. Needcompany representa a onda de novos grupos de teatro da Bélgica que nos últimos anos nos tocaram com o seu teatro físico, forte e perturbador. Do mesmo país vem Vandekeybus, cuja companhia é a mais nova e mais multinacional de todas que escolheu definitivamente exprimir- se através da linguagem corporal. Sosta Palmizi e Borriello são exemplos prometedores do desabrochar da moderna dança italiana, enquanto que Daniels, que traz até Lisboa a sua actuação a solo muito marcante no aspecto físico, é um dos expoentes máximos do mundo da dança holandesa, de si tão rica. O sarcasmo musical da Nuremberg Pocket Opera e a magia visual de Bow Gamelan – o grupo que fechará o Festival – representam os contrapontos musicais a esta nova mostra do jovem teatro europeu. Esperamos muito sinceramente que este Festival não seja apenas bem sucedido no que respeita o seu objectivo primordial propiciar dez dias de prazer e encantamento. Esperamos também que sirva de estímulo para uma troca de ideias e de planos, tanto agora como no futuro.
Roberto Cimetta
Inteatro Polverigi Itália / ltaly
George Brugmans
Springdance Utrecht Holanda / Holland
os eventos
Ficha Técnica
Sob o alto patrocínio
SUA EXCELÊNCIA O COMISSÁRIO DAS COMUNIDADES CARLO RIPA DI MEANA
Apoios
SECRETARIA DE ESTADO DA CULTURA, DIRECÇÃO-GERAL DOS ASSUNTOS CULTURAIS DO MINISTÉRIO DE NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA, ASSOCIATION FRANÇAIS DE D'ACTION ARTISTIQUE, THE BRITISH COUNCIL, MINISTÈRE DE LA COMMUNAUTÉ FLAMANDE, MINISTÉRIO ESPANHOL DE CULTURA, EMBAIXADA DA REPÚBLIDA FEDERAL DA ALEMANHA, MINISTERO DEL TURISMO E SPETTACOLO, ROMA E NETHERLANDS THEATRE INSTITUT