sobre

Os Encontros Acarte de 1989, já marcados pela ausência de Roberto Cimetta, falecido no final do ano anterior, contam em 1989 com a presença de um espectáculo de Pina Bausch cujo trabalho é, pela primeira vez, apresentado ao vivo em Portugal, bem como com a presença de Tadeuz Kantor, alargando assim o âmbito de actuação dos Encontros à Europa de leste. No seu âmbito é discutida a relação da “Crítica com as Artes do Corpo” assim como as “Culturas Nacionais e a Europa”.

Escrevem os Directores da Iniciativa:

 

Para Roberto Cimetta*

13 Fevereiro 1949 – 23 Setembro 1988

uma grande saudade

*co-director artístico dos ENCONTROS ACARTE 87 e 88

 

A Europa em que acredito. A Europa da cultura.A Europa cujo aspecto geográfico nãoconstitui senão uma pequena parcela da suaverdadeira dimensão.A Europa que, depois de investir na cooperaçãoeconómica, está à procura da sua alma e da suacoesão espiritual, no dizer do Papa João Paulo II. A Europa das Comunidades, como base estável,sem recusar uma abertura ao Mundo (de acordocom a tradição histórica das nações europeias) esobretudo ao países de Leste, seus irmãos, queajudara a reencontrar os valores da democracia edos direitos do homem.Portugal, integrado no contexto cultural europeupor direito próprio, com a riqueza de muitos séculosde cultura, com a sua língua, a sua vivíssimaLiteratura, os seus monumentos, a variedade dassuas paisagens, 0 valor dos seus artistas plásticos,musicais, de teatro e de dança, a lutar pelasobrevivência, valorização e divulgação noestrangeiro da sua maneira de estar no mundo.Os Descobrimentos Portugueses, ponta de lançacuja contribuição para a construção da Europa nãopode ser ignorada, pois foi a partir do conhecimentoda não Europa que a noção de Europa seconsciencializou.A dimensão atlântica de Portugal, que poderáproporcionar as Comunidades Europeias um pontode equilíbrio favorável ao seu futuro.A Europa, Portugal e o futuro.

 

Os ENCONTROS ACARTE – NOVO TEATRO/DANCA DA EUROPA, iniciados em 1987, nasceramda vontade imperiosa de contribuir para a completaintegração de Portugal no contexto cultural europeue partiram das asserções e dos princípios atrásenunciados.Através da apresentação de espectáculos comcaracterísticas inovadoras e de experimentalismo,procurou-se informar o publico português do que seestava a passar na Europa, no domínio da criaçãoteatral e da dança e promoveu-se um intercambio deideias, de reflexões e de experiencias, com vista afavorecer o desenvolvimento da cultura artística europeia. Os primeiros ENCONTROS constituíram uma espécie de choque. O seu impacto foi enorme juntodo publico português e atraiu as atenções da EuropaComunitária sobre o nosso pais. Em 1988, verificou-se a confirmação do interessedo público e procuraram-se novos caminhos: o do trabalho de jovens artistas portugueses, sob a orientação de um director estrangeiro, 0 das estreiasmundiais e o das co-produções internacionais.Algumas companhias estrangeiras de grandenível alternaram com outras de carácter maisexploratório e multidisciplinar, assim como comimportantes criações portuguesas. Os ENCONTROS ACARTE 89 constituem comoque uma simbiose dos dois ENCONTROS precedentes. A programação não teve por objectivo apresentar apenas obras primas (ou como tal já consagradas) mas exemplificações do trabalho criador em curso na Europa. Assumiu-se a desigual representatividade dascompanhias e dos espectáculos programados, naintenção de imprimir aos ENCONTROS um carácter de frescura e de surpresa, que os tornassem mais lúdicos e, simultaneamente, mais enriquecedores doponto de vista da vivencia cultural que Ihes éinerente. Considerando a divisa que nos vem da área económica Cooperar para Crescer, continuou-se coma politica das co-produções internacionais, este anoconsubstanciada no espectáculo Ça Va, pela Companhia NEEDCOMPANY, que tem obtido grande sucesso nas cidades em que foi apresentado. A vertente programática das estreias mundiais vai confinar-se, em 1989, a representação portuguesa: A Ilha de Oriente, original inédito de MARIO CLAUDIO,com encenação de Filipe La Feria, dentro de uma estética de inspiração indiana, e a primeira parte do espectáculo Nocturno, em que a nossa grande pianista MARIA JOÂO PIRES tocará os Nocturnos de Chopin, com visualização plástica pelas MARIONETAS DE SAO LOURENÇO. Artistas portugueses estarão igualmente presentes no espectáculo Descobertas, resultado de um workshop dirigido pela bem conhecida Companhia WELFARE STATE INTERNATIONAL e em que também colaborarão actores ingleses. Este e umdos aspectos dos programas dos ENCONTROS ACARTE 88 e 89 que nos parece de salientar, pois além de contribuir para a formação dos nossos jovens artistas, abre-lhes fronteiras, como já aconteceu com Tiago Porteiro e Duarte Barrilaro Ruas, que participaram em 1988 no espectáculo De Noite, dirigido por GIORGIO BARBERIO CORSETII, com base em textos de Kafka, e entretanto foram convidados para Polverigi e Salzburgo, estando já previstas apresentações em vários outros Festivais europeus. Sessões de vídeo-dança (uma experiencia nova),cinema ao ar livre e musica ao vivo, para preencheros fins de cada noite, são actividades complementares do programa dos ENCONTROS ACARTE 89, que assim se enriquece com a inclusão de outras disciplinas, para além das suas disciplinas temáticas. Pólos de reflexão imprescindíveis numa iniciativa com tão importantes objectivos, os Seminários sobre “As Culturas Nacionais e a Europa” e “A Crítica e as Artes do Corpo”, contam com a participação de pensadores e de especialistas portugueses e estrangeiros que, alem de proferirem comunicações, intervirão nos debates. O intercâmbio de pensamentos e de experimentações, a vivencia cultural, a inovação artística, o carácter lúdico dos ENCONTROS ACARTE 89 encontram-se assim assegurados a partida.Queira o publico participar também com o seu entusiasmo, o seu espírito critico; queira ele fazer um acto criador e contribuir para garantir aos ENCONTROS uma posição de relevo no panorama cultural português e um lugar ao sol no quadro dos acontecimentos artísticos da Europa.

 

Estoril, Julho de 1989

Maria Madalena de Azeredo Perdigão

 

Os Encontros ACARTE vão reunir pela terceira vez artistas europeus e profissionais do teatro nos edifícios e jardins da Fundação Gulbenkian.Os Encontros do ano passado formularam conscientemente algumas questões quanto à natureza e identidade deste projecto. Há muitos objectivos a concretizar num encontro que see stende por tão curto período de tempo. Os mestres da cena teatral europeia têm de ser apresentados em Portugal, mas as novas evoluções da dança moderna e o teatro também tem de descobrir o caminho ate ao público português. Por outro lado, também as produções portuguesas tem de se mostrar a um publico internacional, que aproveita a oportunidade da realização dos Encontros para vir a Portugal e travar conhecimento com o pais. E, não menos importante, tem de se organizar um verdadeiro encontro, prática e objectivamente como colaboração entre os artistas portugueses e estrangeiros, e também para o intercâmbio de ideias e contactos através de debates, conferências e todos os meios possíveis. Todos estes elementos, reunidos num campo deforça tão construtivo quanto possível, constituirã oos Encontros ACARTE 89. Os mestres ao mais al tonível estão representados por Pina Bausch, da Europa Ocidental, e por Tadeusz Kantor, da Europa do Leste. “L’Esquisse”, Angelika Oei, “CloudChamber” e o “La Tartana Teatro” juntamente com os anteriormente convidados Wim Vandekeybus e a“Needcompany” constituem excelentes exemplos da abordagem aberta, multi-disciplinar e experimental do novo teatro europeu, que tem caracterizado os Encontros desde o seu inicio. O “Welfare State International” regressa a Portugal para trabalhar com artistas portugueses, na sequencia de um workshop realizado em Maio de 1987. O programa deste ano dedicado ao vídeo e aocinema testemunha os desenvolvimentos actuais, num contexto mais vasto que qualquer programaçãoconcreta em palco jamais poderia fazer, estabelecendo, a propósito, os fortes elos entre a nova dança moderna e o cinema. Finalmente efectuar-se-ão dois seminários: um sobre A Critica e as Artes do Corpo, e outro para sondar o ambiente sobre um tema com que todosnos defrontamos: A Europa. Neste ultimo seminário,os portugueses e os convidados estrangeiros trocarão ideias sobre a relação entre cultura nacional e cultura europeia, sobre filosofias e organizações onde a Europa já e o ponto de partida e sobre a teoria e pratica de projectos europeus concretos.

A visão da Europa como um novo centro, a partir do qual se pode construir uma forte imagem anível cultural e politico, e uma visão contestada.Contudo, foi o sonho de um território europeu para as artes, coerente mas pluralista, que motivou iniciativas como os Encontros ACARTE. Esperemos que a sua terceira edição constitua um passo mais para a concretização desse sonho.

 

Polverigi, Junho de 1989

George Brugmans

Na imprensa pode ler-se:

 

Tudo passa pelo natural afastamento geográfico do canto luso: Existe um projecto de proximidade chamado “Europa”, pelo que se torna urgente encurtar as distâncias. Para isso, promovem-se encontros onde as pessoas vêem coisas com que nem sonhariam se não saíssem daqui. Para deixarmos de estar condenados ao consolo adiado dos críticos da Imprensa estrangeira, voltou ao horizonte o oásis anual dos Encontros ACARTE. O primeiro encontro deu-se entre o espectador e o programa. Foi quando se imaginou que, de acordo com a escolha da organização, se iam ver coisas maravilhosas, todas as superestrelas que os deuses inspiraram. […] A novidade destes espectáculos terá consistido também na mistura inusitada de linguagens/acontecimentos num mesmo momento, as referências confundem-se e entramos num tipo de discurso mais universal, porque mais emotivo, mais como elaboração do instintivo urbano. (…) O segundo encontro foi com a surpresa. (…) A Needcompany inspirou-se na história verdadeira de uma criança, que se suicidou passando-a no espaço da cena para o desejo de ser anjo. (…) Ça Va inspirou-se na ópera Aida, de Verdi, em Werther, de Goethe. Explorou o teatro como palco possível para as banalidades da vida e como espaço de reflexão sobre si. (…) Cloud Chamber, com o espectáculo “The Twilight Club” esteve próximo de um concerto rock pelos elementos que o compuseram: música ao vivo, dança, texto, projecção de diapositivos e filme. Mas nem tudo isso junto os livrou de uma valentíssima pateada por parte de um público que se acotovelou numa indescritível bancada inventada na garagem. […] Vanderkeybus é uma estrela de 26 anos que faz de oito corpos que se querem tocar um dos momentos mais bonitos destes Encontros. […] É essa a linguagem. O movimento, só vendo. (Cristina Peres, Blitz, 26-09-1989)

 

Festival de la Gulbenkian.

Liquidada rápidamente la ingénua idea de la unidad cultural europea frente a la singularidad de las distintas culturas del viejo continente, se abrió un debate que va cobrando peso en los medios artísticos e intelectuales de la Comunidad.¿ De qué Europa se está hablando? ¿Qué proyecto real es el que está en marcha? Las respuestas iban desde el campo filosófico a los datos precisos, a las cifras minúsculas que la Comunidad Europea dedica actualmente a la acción cultural. ¿ Coartada del poder? ¿ Máscara o adorno de otros intereses? La lucha de siempre, esta vez por una Europa donde el arte, el poder y la ciencia tengam un destino humano. En el escenario, mientras tanto, Este y Oeste mostraban las imágenes desoladas – com o sin dinero – de su mundo. Y no sé muy bien si, por ello mismo, la esperanza. (José Monléon, Diário 16, Madrid, 26-9-1989)

BUC e ACARTE Permutam Espectáculos Culturais

A Bienal Universitária de Coimbra, empenhada numa luta “para que a cidade não deixe de constituir parte integrante de um circuito essencial de circulação dos grandes espectáculos que se vão organizando no nosso país” promove nos próximos dias 23 e 26, no Teatro de Gil Vicente, dois espectáculos que constituem uma extensão dos encontros “Acarte” na cidade mondeguina. Medida de enorme relevância no panorama cultural da urbe – e todos nós sabemos como Coimbra vinha sendo preterida na apresentação das grandes iniciativas, que apenas contemplavam as metrópoles de Lisboa e Porto […].Em nota agora difundida, a BUC enfatiza o significado especial da iniciativa, já que “os espectáculos em questão são os primeiros frutos de um acordo entre a Bienal de Coimbra e o serviço ACARTE […]. (O Comércio do Porto, 19-9-1989)

SEC Organiza Viagem aos Encontros ACARTE

Por ocasião dos “Encontros ACARTE” organiza a SEC-Norte uma excursão a Lisboa, no próximo dia 27, para possibilitar aos interessados no Porto a visão do espectáculo de Pina Bausch, por impossibilidade da companhia de dança da Ópera de Wuppertal se deslocar ao Porto. A partida está marcada para as 8.30 horas, em autocarro de turismo, do Auditório Carlos Alberto; chegada à Fundação Gulbenkian pelas 14.30 horas e regresso previsto para as 24.30 horas, depois do espectáculo. A viagem, com bilhete de 1ª plateia incluído, custa 3 mil escudos.  (Jornal de Notícias, 21-9-1989)

 

Avizinha-se o grande acontecimento que, seguramente, serão os Encontros Acarte 89 […]. Num país onde a maioria dos artistas não ganha nem para viajar à roda do quarto, assume particular importância a possibilidade de verem trabalhos dos mais destacados criadores ou qualquer oportunidade de contacto internacional. (Sábado, 2-9-89)

Estamos a meio dos Encontros Acarte 89. Quem gosta de teatro moderno, aproveite. […] (O Independente, 22-9-89)

Compensando a condição periférica do País – Pina Bausch e Tadeus Kantor nos Encontros ACARTE 89 […] (O Comércio do Porto, 11-5-1989)

Teatro e Dança da Europa reunidos na Gulbenkian

Integrar Portugal na cultura da Europa […]. (Correio da Manhã, 16-9-1989)

 

Entre as manifestações mais evidentes da existência dessa rede [de intercâmbio cultural entre os países europeus], conta-se a realização de festivais artísticos, quer sejam de dança, cinema, vídeo, teatro ou música, quer consistam em exposições e feiras de artes visuais”, como expressa M.A.P., directora do ACARTE, no catálogo dos “Encontros”. […] Vale a pena ir até Lisboa e assistir à projecção daquilo que faz a faceta cultural europeia de momento. A inserção na CEE passa também e muito particularmente, pelas questões culturais assim o afirmam todos aqueles que pela terceira vez concretizam os Encontros ACARTE.  (Jornal Região das Caldas, 14-9-1989)

 

Desta vez, co-dirigidos por George Brugmans, com o alto patrocínio de Sua Excelência o Comissário para a Cultura das Comunidades Europeias Jean Dondelinger e virados para uma (tão em voga) vertente de “europeização” cultural, os já imprescindíveis Encontros ACARTE vêm neste Setembro morno aquecer o início da temporada. (António Laginha, Semanário, 16-9-1989)

Na sanduíche dos Encontros ACARTE o pão é o melhor

Se olharmos os Encontros ACARTE – Teatro e Dança na Europa – deste ano como uma sanduíche que, aliás, promete saborosas refeições vemos duas fatias de pão de primeira qualidade: o celebrado Teatr Cricot 2, dirigido por aquele que é justamente considerado como um dos criadores do teatro do nosso tempo, o polaco Tadeusz Kantor, e vemos o Tranztheater Wuppertal, dirigido por uma das grandes personalidades da dança contemporânea, a alemã Pina Bausch.  (Diário de Lisboa, 7-9-1989)

Centrados no novo teatro/dança e no teatro visual e plástico, os Encontros Acarte pretendem, como tem sido referido pelos organizadores, “examinar em que consiste a identidade cultural europeia, sublinhar as semelhanças sem deixar de pôr em relevo as diferenças e suscitar a discussão”. […] A rica e intensa rede de culturas existentes no nosso velho/novo continente constitui um dos elementos mais fortes para a redefinição da Europa. Entre as manifestações mais evidentes da existência dessa rede, conta-se a realização de festivais artísticos e os Encontros Acarte, agora na sua terceira edição, têm como principal objectivo contribuir para uma maior integração de Portugal no movimento cultural europeu. (Margarida Botelho, Diário de Notícias, 27-8-1989)

 

O prazer lúdico do espectáculo, ou a necessidade de conhecer as experiências culturais que a Europa vive, poderão levar-nos a todos aos Encontros de Setembro do ACARTE. […] “Concordo inteiramente com Fernando Dacosta quando se insurgia contra o espírito formigueiro dominante na Europa. Estamos a esquecer o aspecto lúdico que corresponde à ideia da cigarra”, afirma Madalena Perdigão. […] Uma outra curiosidade destes Encontros ACARTE é a presença de dois jornalistas a coordenar os seminários. A Alexandre Melo caberá “A Crítica e as Artes do Corpo”, um pretexto para artistas, escritores e críticos desbloquearem tensões ou afastamentos. Entre os convidados, anuncia-se a presença dos portugueses Constança Capdeville, José Gil e António Pinto Ribeiro, e de Burt Suppre (EUA), Thomas Erdos e Laurence Louppe (ambos de França). “Para não dar um ar muito intelectual aos seminários”, e porque os jornalistas têm muitas vezes mais facilidade em “dinamizar as discussões”, são as razões apontadas para a escolha. A jornalista Maria Elisa coordenará o debate em torno de “As Culturas Nacionais e a Europa”. Trata-se de aprofundar as relações entre as culturas nacionais e um sonho, que muitos contestam, “de um território europeu coerente para as artes, que foi o que motivou iniciativas nas quais se inserem os Encontros ACARTE”, escreve George Brugmans. (Ana Paula Dias, Jornal do Comércio, 8-8-1989)

 

Iniciados em 1987, os Encontros Acarte, com a sua revelação ao público português do Novo Teatro/Dança da Europa ocupam, de justiça, um dos mais importantes momentos da vida artística e cultural do nosso país. Trata-se, com efeito, de uma iniciativa que muito tem enriquecido o nosso meio artístico e cultural, e da qual começam já a detectar-se, entre nós, alguns resultados…uns mais positivos e ponderados do que outros, é certo, o que, de resto, não invalida a enorme importância desta notável acção do Acarte […], acção que se deve, particularmente, ao entusiasmo e ao espírito esclarecido e lutador de M.A.P., a directora e impulsionadora do Acarte, que na realização destes Encontros tem contado com a colaboração de George Brugmans e Roberto Cimetta […] Para anunciar o que vão ser os Encontros Acarte 89 […], a directora do Acarte reuniu há dias, à sua volta, os órgãos de comunicação social, críticos e artistas numa breve conferência de imprensa em que foi distribuído um grosso e bem esclarecido dossier informativo… […] M.A.P. informou que nesta quase maratona que vão ser os Encontros Acarte 89, uma vez mais eles incidirão sobre o Novo Teatro/Dança da Europa como ponto de partida para uma reflexão sobre “um território europeu coerente para as artes”. (Tomaz Ribas, A Capital, 5-8-1989)

 

Cultura Europeísta Defendida na “ACARTE 89

M.A.P […] afirmou que estes encontros servirão para “pôr Portugal no contexto cultural europeu e para definir objectivos para uma cultura europeísta, para além de os portugueses e estrangeiros trocarem ideias sobre a relação entre a cultura nacional e europeia”. […] Filipe La Féria […] aproveitou para criticar a Secretaria de Estado da Cultura ao afirmar que “em Portugal continua a ser muito difícil fazer teatro, pois os artistas nacionais trabalham em condições humilhantes, e sem ajuda da SEC”. […] A novidade para este ano será o desconto de 50 por cento para grupos superiores a 40 pessoas, de modo a ser possível que os portugueses não residentes em Lisboa possam organizar excursões e participar activamente nos ”Encontros Acarte 89”.  (O Comércio do Porto, 1-8-1989)

Lisboa não é Paris, Londres ou Nova Iorque. Mas, de vez em quando, a capital portuguesa dispõe de espectáculos de nível muito alto, guindando-a a grande capital cultural. Neste texto que agora publicamos chama-se a atenção para duas grandes figuras do teatro e da dança que Lisboa vai ver dentro de dias. (…) Se o teatro sofreu uma verdadeira revolução a partir dos anos 60, com tendências variadíssimas a manifestarem-se e com a consagração de nomes como Samuel Becket, Ionesco e Grotowsky, um nome granjeou fama mundial. Veio da Polónia, um país avançadíssimo na teoria e prática teatrais e chama-se Tadeusz Kantor. (…) Outro aviso sério à população de Lisboa vai para os espectáculos que a coreógrafa alemã Pina Bausch vai dar na ponta final dos Encontros Acarte. Ela é, hoje por hoje, uma figura ímpar da dança moderna alemã e europeia. (…) O último aviso tem a possibilidade de dar algum fôlego aos possíveis futuros espectadores. Trata-se dos Festivais de Outono, previstos para Novembro e Dezembro, e que vão trazer a Lisboa grandes espectáculos, aguardando-se a todo o momento o programa definitivo.  (Carlos Benigno da Cruz, Diário Popular, 7-9-1989)

Europa Artística “vem” a Lisboa “pela mão” da Gulbenkian

(Correio da Manhã, 30-8-1989)

Dos Encontros Acarte só resta, agora, a estreia de A Ilha do Oriente, peça de Mário Cláudio encenada por Filipe Lá Féria cuja estreia foi adiada para a próxima sexta-feira. A choca normalidade cultural em que costumamos estar vai sendo reposta, pois, mas permita-se-nos ainda um registo. Todas as noites, assim que terminavam os espectáculos de teatro e dança nas diversas salas da Gulbenkian, abriam-se as portas do bar do CAM para um pedaço de música, ali mesmo, ente as mesas. […] Ana Firmino já actuara, há uns tempos, em território da FCG. […] Um novo convite a esta cantora que nas ilhas de Cabo verde só não é rainha porque a rainha das cantorias se chama Cesária, é a prova provada de que Lisboa já vai respeitando a sua comunidade cabo-verdiana que nela habita e a cultura desta começou a sair do “guetto”.  (Rui Eduardo Paes, Diário de Lisboa, 20-8-1989)

 Os ACARTE 89 jogaram-se, a nosso ver produtivamente, em limites contraditórios ao aceitarem a presença no programa de formas teatrais quer podem ser consideradas clássicas na sua modernidade e que em especial impunham um estatuto de consagração e de fama que o projecto dos encontros parece repelir. Referimo-nos evidentemente à presença de Tadeusz Kantor e de Pina Bausch […] O Jorge Listopad lembrou no “JL” que defendemos no “DL” a inclusão destes artistas nos Encontros como processo, acrescentamos, o único processo de estabelecer pontes, mesmo que precárias, sobre terrenos desconhecidos. […] Aproveitamos a boa memória de Jorge Listopad […] para chamar a atenção para o facto, que me parece saudável, de poder haver, e é bom que haja, uma certa sintonia entre o público, os produtores de espectáculos e os promotores dos festivais, e os que sobre eles trabalham pela escrita, e que essa sintonia pode ser proveitosa para toda a gente. […] Valerá a pena […] chamar a atenção para o facto de que com o Cricot Theater e com o Tanztheater Wuppertal não se terem esgotado as possibilidades de dar a conhecer ao público português trabalhos essenciais do teatro contemporâneo, mesmo correndo o risco de não cumprir cabalmente o programa que o título dos Encontros propõe, ou impõe. Já agora sublinhe-se a carga demagógica que em arte o adjectivo novo pode assumir. […] Se ver Tadeusz Kantor e Pina Bausch foi ao mesmo tempo uma lição e um prazer, o vazio da nossa ignorância exige outras experiências que urge conhecer: Bob Wilson, Richard Foreman, num campo; noutro, espectáculos de Giorgio Strehler, Peter Stein, Turi Liubimov, Peter Brook, Ariane Mnouchkine, Gruber, Antunes Filho, por exemplo, são-nos indispensáveis. Esse teatro não corresponde ao adjectivo novo? Só vendo. Esta nota não pretende fazer o balanço dos Encontros, cuja importância ninguém se atreve a negar, cujo lugar de imprescindibilidade na prática cultural em Portugal ninguém quererá discutir. (Carlos Porto, Diário de Lisboa, 7-10-1989)

O teatro na Europa é também o que vimos no Grande Auditório da FG, no primeiro dia dos Encontros Acarte. […] Se não me engano, foi Carlos Porto quem, numa nota crítica aos Encontros Acarte 88, sugeriu a participação nos futuros Encontros de Kantor e de Pina Bausch. Graças à sensibilidade e a outras qualidades práticas de Madalena Perdigão, ei-los ambos aqui. Merece a nossa gratidão. […] Quanto ao espectáculo propriamente dito, no seu todo: uma obra de repetição, com apenas um ligeiro prolongamento, obra de pausa, talvez para pôr em ordem os papéis do primeiro testamento. (Jorge Listopad, Jornal de Letras, 19-9-1989)

 

Em sua terceira edição os Encontros ACARTE continuam a revelar-se uma das mais importantes realizações artísticas internacionais entre nós, trazendo a Lisboa presenças de conhecimento indispensável do teatro contemporâneo, e levantando algumas questões em torno da contiguidade e do cruzamento de várias disciplinas artísticas no espectáculo teatral. […] Apesar de “conhecido entre nós” [Tadeusz Kantor] por terem passado na televisão duas das suas produções (A Classe morta e Wielopole, Wielopole), constituía indubitavelmente uma lacuna na cena portuguesa (no âmbito das “visitas” internacionais), tão mais intensamente sentido quando se sabia já que a sua companhia Cricot 2 estivera várias vezes em Madrid (tão perto – geograficamente; tão longe – cultural e teatralmente…). Por outro lado, não há dúvida que o próprio projecto animador destes Encontros ACARTE assenta em premissas inerentes à prática estética de Kantor, que, prolongando a postura vanguardista, questiona a função da palavra no teatro, articula formulações artísticas diversas, e interroga-se sobre a natureza, função e valor da arte e do artista no mundo contemporâneo. […] É, pois, um teatro de confissões em que vagueiam fantasmas pessoais e colectivos (da história) e que revela uma apurada orquestração dos tempos e uma composição cuidada das imagens. É um teatro que nos devolve uma realidade problemática como entendimento pessoal de um artista que viveu já mais de sete décadas e cuja proposta estética é emotivamente forte e perturbante.(Maria Helena Serôdio, O Diário, 23-9-1989)

 

“Encontra-se Portugal na situação de ter um único festival de teatro e dança, no qual são depositadas todas as expectativas do seu público, criadas, entretanto, pela programação habitual da FG e designadamente do Acarte. De facto, desde o início do funcionamento deste serviço […], ele veio protagonizar o processo de divulgação da prática artística contemporânea, acompanhada por aproximações teoréticas e propedêuticas realizadas em colóquios e workshops. Culminando esta missão polarizadora, nasceram em 1987 os Encontros Acarte, designação pleonástica de um festival que se pretende celebrar os novos teatro, música e dança europeus. […] Cumprindo a divulgação algo aleatória da contemporaneidade artística europeia a que se propôs, deverá na próxima edição ver resolvidos problemas como o da sua delimitação estética, o que passará pela opção entre a consagração do festival através de espectáculos de prestígio ou a caracterização como um festival experimental; tal como haverá de decidir o apostar seriamente na dança e teatro portugueses. E longa vida aos Encontros Acarte. (A.F. Castanheira da Costa, Expresso, 30-9-1989)

 

Um lugar ao sol na constelação artística europeia é reclamado pelo projecto que mobiliza os Encontros Acarte; num momento, sintomático, em que essa Europa da arte nos visita marcadamente sombria e niilista, gerindo uma capacidade criativa mais próxima da irrisão residual do que dos efeitos de uma pretensa originalidade ou invenção, definitivamente postas de parte. Não querendo subscrever catastrofismos estéticos com a facilidade de milenarista – até porque o teatro-dança é pela sua experimentalidade intrínseca uma zona de fronteiras indefinidas – o que surge, uma vez visionada a quase totalidade dos espectáculos que integraram os Encontros deste ano, é o apelo em recordar as palavras perturbantes de Eduardo Lourenço, proferidas no primeiro do seminários paralelamente realizados com presenças anunciadas e ausências como a de Guy Scarpetta: a Europa, continente sem sujeito, “não possui alma para o corpo que tem”. Sendo a alma hoje uma palavra obscena, como o pensador não deixou de afirmar, e estando o corpo a subordinar as artes; não terá sido ainda desta vez que se viu “reinventar o sentido para uma História”, em qualquer dos acontecimentos de nível qualitativo diverso que o Acarte nos possibilitou, como excepcional destaque para Tadeusz Kantor e Pina Bausch.  (Armando Correia, O Jornal, 29-9-1989)

 

Terminaram os Encontros ACARTE deste ano e, ainda que tenha sido desigual o valor do espectáculos (como é natural nestes casos), a verdade é que eles animaram durante doze dias os vários espaços da FCG (desde o grande auditório ao CAM, os jardins, garagem e anfiteatro ao ar livre) envolvendo, e muitas vezes entusiasmando, um público numeroso que não quis faltar a estes ”encontros” que, sem sombra de dúvida, ocupam já um lugar privilegiado no roteiro artístico de Lisboa Foram respeitados na generalidade os critérios que a Dr.ª M.M.A.P. vem definindo para a iniciativa de que é principal animadora: a presença de grupos estrangeiros, tanto consagrados como de cariz mais experimental, a estreia de uma produção do ACARTE […] e formas de colaboração entre companhias estrangeiras e artistas portugueses (fora o Corsetti no ano passado, foi o Welfare State este ano). […] E embora reconheça que alguns aspectos muito específicos da dança contemporânea me escapem, não posso deixar de reconhecer, mesmo nos casos de algum valor artístico na execução gestual e coreográfica, a frivolidade de um projecto como o de Cloud Chamber no espectáculo Twilight Club, a frieza cerebral do jogo em Ça va ou em Les Porteuses de mauvaises nouvelles (Mensageiros de más notícias), e o limitado âmbito de representação e emoção em Oidan Skroeba. (O Diário, 30-9-1989)

 

Como se disse na crónica da semana passada há riscos evidentes na banalização da fórmula que encontramos realizada com pujança artística pela companhia de Pina Bausch. Essa banalização arrasta alguma superficialidade e a procura de efeitos variados num processo de colagem que muitas vezes não alcança a unidade artística (ainda que consideremos alcançável por uma estética de rupturas e descontinuidades), nem toca verdadeiramente a esfera emotiva do espectador.  (Maria Helena Serôdio, O Diário, 7-10-1989)

 

“Se com o Outono regressámos ao deserto teatral em Lamego, na capital do reino, em Lisboa, aconteceram coisas dignas de registo. Para além da estreia de espectáculos pelas companhias profissionais no início de nova temporada teatral, aconteceu os “Encontros ACARTE 89” e a fundação do Centro Nacional de Teatro. E está anunciado o Festival de Outono de Lisboa, que tem como director teatral Adolfo Gutkin e prevista a participação de várias companhias europeias. […] Em 23 de Setembro efectuou-se, no Teatro Villaret, em Lisboa, a assembleia fundadora do Centro Português de Teatro, tendo sido aprovados os projectos dos estatutos e regulamento geral interno, além de eleitos os órgãos sociais. A sua primeira organização será o “1º Encontro Nacional de Teatro”, na Faculdade de Letras, nos dias 1, 2 e 3 de Dezembro. (Lamego Hoje, 5-12-1989)