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Em 1988 o ACARTE leva a cabo uma Mostra de Dança Alemã Contemporânea, organizada por Susanne Linke que dois anos antes se apresentara na Sala Polivalente. Madalena Perdigão contextualiza a iniciativa:

 

MOSTRA DE DANÇA CONTEMPORÂNEA ALEMÃ
A apresentação de Susanne Linke em Portugal, em Março de 1986, constituiu uma revelação. A sua arte, mais apostada em seguir o caminho da dançado que o do teatro-dança alemão, a sua capacidade de comunicação com 0 publico, a original utilização que faz de objectos do quotidiano, a capacidade de exprimir sentimentos, ansiedades, receios, lutas, resignação, através do movimento, tudo isto criou um clima de expectativa, não apenas relativamente a uma nova apresentação entre nos desta grande bailarina e coreografa, como também a um melhor conhecimento da dança alemã de hoje. Expectativa tanto mais justificada quanto e certa a influencia da dança alemã na nova dança europeia e até, em tempos mais recuados, cerca dos anos 20, na modern dance americana. A presente MOSTRA DE DANCA ALEMA CONTEMPORANEA ocorre na sequência destes factos e dispôs, a partida, de dois poderosos trunfos: o apoio do Goethe-Institut, cujo Director, Dr. H. A. Oehler, concedeu entusiástica adesão a iniciativa, e a colaboração da própria Susanne Linke, que nos auxiliou na escolha das Companhias a apresentar. Entre estas, conta-se a Folkwang Tanzstudio, com tradições históricas que remontam a mais de sessenta anos e em cuja Escola se formaram algumas das mais importantes bailarinas alemãs da actualidade, como Pina Bausch, Reinhild Hoffmann e Susanne Linke. Com um reportório constituído por coreografias do japonês Mitsuru Sasaki, oriundo do mundo da dança Butô, 0 Folkwang Tanzstudib vai permitir-nos apreciar o resultado da convergência de dois estilos e de duas técnicas, oriental e ocidental. A Companhia que se segue (depois de Susanne Linke) evidencia uma coreógrafa e bailarina de grande talento, Christine BruneI, que encontra inspiração na escultura, em temas da Antiguidade e na natureza. Tanzfabrik Berlin termina a Mostra, apresentando técnicas e métodos variados, inclusive de raiz oriental. Esta Companhia, orientada no sentido da experimentação de novas formas da dança, busca a colaboração com artistas de outras disciplinas, como a musica, a literatura, os diapositivos e os filmes. Com uma tal diversidade de perspectivas e com tão seguros valores, estamos certos que a MOSTRA DE DANCA ALEMA CONTEMPORANEA vai constituir um marco notável no nosso conhecimento das tendências actuais da dança e contribuíra certamente para uma maior aproximação cultural entre a República Federal da Alemanha e o nosso País.

 

Lisboa, 20 de Abril de 1988
M. M. A. P.

 

Na imprensa pode ler-se:

 

Depois do êxito da Mostra de Teatro Holandês, a FG vai apresentar a Mostra de Dança Alemã Contemporânea, cujos espectáculos se iniciam amanhã, prolongando-se até ao próximo dia 22. Quatro grupos de alta qualidade vão apresentar o valor artístico da coreografia germânica, durante uma mostra a decorrer na sala polivalente do CAM da Gulbenkian, entre os próximos dias 3 e 22 do corrente mês. A mostra incluirá ainda três sessões documentais (filmes e vídeos falados em português) sobre artistas e tendências da dança alemã contemporânea desde as suas origens até aos nossos dias.  (Diário Popular, 2-5-1988)
Com tradições históricas que remontam a mais de 60 anos e em cuja Escola se formaram algumas das mais importantes bailarinas alemãs, como Pina Baush, Reinhild Hoffmann e Susanne Linke”, tal como refere MAP, a propósito desta mostra, o Folkwang Tanzstudio apresenta “O Barco Ébrio” […]. (Diário de Notícias, 3-5-1988)

 

Todos sabem como Mary Wigman e Kurt Jooss (que tanto admirava a bailarina/coreógrafa) marcaram profundamente os rumos da dança nos anos 20. Com efeito, embora o bailado clássico estivesse aí perfeitamente enraizado, foi da Alemanha que sopraram os ventos da renovação e da modernidade no âmbito da dança europeia (e com ecos importantes no Novo Mundo). […] “O Barco Ébrio” foi coreografado em 1985 por Mitsuri Sasaki, um japonês que cresceu dentro da dança Buto, mas que se considera discípulo de Folkwang Hochshule. […] “O Barco Ébrio” é um trabalho honesto, sem dúvida, mas tamb´m longo, repetitivo, mais um trabalho experimental. Os gestos, os ritmos, as sequências, são de uma intensidade estudada, bem desenhados, eficazes na sua função estética, mas frios.  (Maria de Assis, O Dia, 6-5-1988)

 

O CORPO FALA PELAS PESSOAS
[…] Susanne Linke utiliza adereços nos seus espectáculos e objectos banais como banheiras, toucadores, toalhas, utilizando esses objetos como um trampolim para meditação metafórica. Quer dizer: deixar o corpo falar pela pessoa, transmitir em movimento uma aloquência sem palavras… eis Susanne Linke.” (O Dia, 6-5-19)
Depois do excelente trabalho que foi o ciclo “Dança Brasileira contemporânea”, o ACARTE traz ao conhecimento do público lisboeta uma outra expressão nacional de dança – a dança alemã actual, onde pontificam alguns dos nomes mais significativos das actuais tendências da expressão balética moderna. […] O Folkwang Tanzstudio e o seu fundador representam uma linha bem demarcada no conjunto das tendências da dança deste século. Menos conhecido – ou menos divulgado – que Fokine, Balanchine e Martha Graham (EUA), Roland Petit e Marquês de Cuevas (França) ou Maurice Béjart (Bélgica), Kurt Jooss escolheu uma via temática onde a intervenção social inspira e se revela no bailado. […] Um dos grandes nomes europeus da dança actual é Susanne Linke. Ela destaca-se no conjunto dos grupos alemães que nos visitam, formando com Pina Baush o duo coreográfico europeu mais significativo do momento. […] De Pina Baush tem a RTP-2 transmitido alguns trabalhos, como ocorreu na programação da passada segunda-feira. Susanne Linke vamos podê-la apreciar a partir de terça-feira, ao vivo. Quanto a Reinhild Hoffman, esperemos outra oportunidade. Qualquer delas está convicta do impacto da sua obra nas concepções actuais da dança europeia. Em declaração a uma revista (CNAC Magazine 88), Susanne Linke definiu-se e às suas compatriotas do seguinte modo: “Se eu tentasse esquematizar […] diria que Pina se manifesta através da psicologia; Reinhild através das imagens e eu através da dança. E procuro uma via nova para a dança propriamente dita, no momento em que esta regressa, um pouco por toda a parte, em proveito do teatro. Dança-teatro é uma designação que não fere o trabalho que os grupos da Alemanha Federal vêm apresentar em Lisboa. O bailado é entendido como uma expressão e dentro desta concepção o movimento tem uma linguagem que pode ser um suporte para construir narrativas, desenvolver estudos psicológicos, de ambientes ou de situações históricas. A opção estética filia-se no expressionismo por exclusão de partes. A utilização da arte como um meio de expressar algo mais que um simples jogo formal é uma das características do expressionismo alemão. Por contraste com o impressionismo francês, preocupado com os estudos da cor e as difracções da luz, o expressionismo alemão procura no quadro artístico – seja pintura, teatro, música, literatura ou dança – um expressar da realidade tal como a observa o artista, não receando, pelo contrário, acentuar caricaturalmente os traços, para vincar o que se pretende apontar. (António Melo, O Diário, 7-5-1988)

Ficha Técnica

Mostra de Dança Alemã Contemporânea

FOLKWANGTANZ STUDIO MITSURO SASAKI, SUSANNE LINKE, CHRISTINE BRUNNEL, TANZFABRICK BERLIN,