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O Ciclo Retorno à Tragédia resulta de uma proposta de Jorge Listopad e Orlando Neves, sendo composto por quatro espectáculos de teatro, dois de dança, dois colóquios e uma exposição. Tem como tema central ‘A Tragédia’ e como subtema ‘A Tragédia na Cultura Portuguesa’.

No programa de À Procura da Tragédia, um dos eventos desta iniciativa, Madalena Perdigão explica que as “linhas de rumo fixadas pelo Serviço (prioridade às peças de autores nacionais e a projectos multidisciplinares) se revela[ram] insuficientes” face às muitas propostas apresentadas ao Serviço no âmbito do teatro, havendo assim necessidade de se constituir um ‘Conselho Consultivo de Teatro’ constituído pelos Prof. Doutor José de Oliveira Barata, Dr. Luís Francisco Rebello, Norberto Ávila e Carlos Wallenstein.

 

[…] Porque o ACARTE deu uns primeiros passos no caminho do Teatro – logo no início das suas actividades, e a propósito da Exposição retrospectiva de Almada Negreiros – foram inúmeros os projectos que neste domínio lhe foram posteriormente apresentados, provenientes tanto de Portugal como do estrangeiro. Isso fez com que as linhas de rumo fixadas pelo Serviço (prioridade às peças de autores nacionais e a projectos multidisciplinares) se revelassem insuficientes para a selecção inevitável das propostas que havia a fazer. Daí o ter-se criado o Conselho Consultivo de Teatro, constituído pelo Prof. Doutor José de Oliveira Barata, Dr. Luís Francisco Rebello, Norberto Ávila e Carlos Wallenstein, para permitir elaborar um juízo mais competente e mais profundo dos· projectos que iam sendo apresentados. […]

 

Já no programa da iniciativa, Madalena Perdigão aponta as razões concretas de aceitação deste projecto:

 

Uma das prioridades estabelecidas pelo ACARTE (Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte) no que respeita a actividades teatrais, é a de dar guarida a autores nacionais. Pareceu excelente a ideia de o fazer no âmbito de um ciclo de manifestações culturais, rendo como tema central A Tragédia e como subtema A Tragédia na Cultura Portuguesa. Esta foi, portanto, a razão principal por que demos seguimento à proposta de Jorge Listopad e Orlando Neves no sentido de a Fundação Calouste Gulbenkian organizar, através do ACARTE, o ciclo intitulado «Retorno à Tragédia». Constituído por quatro peças teatrais (representadas ao longo de três meses e meio), dois colóquios, dois espectáculos de bailado, um concerto e uma exposição, o ciclo pretende ser um espaço e um tempo de reflexão sobre A Tragédia, tema fulcral da nossa civilização ocidental. Tal como está concebido – incluindo a apresentação de Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett, de O Fim, de António Patrício, de O Indesejado de Jorge de Sena, e de À Procura da Tragédia, selecção de tragédias portuguesas de 1536 a 1821, da responsabilidade do Dr. Luís Francisco Rebello- o ciclo «Retorno à Tragédia. permitirá uma visão global do teatro trágico ou para-trágico português.

 

Lisboa, Maio de 1986

M.M.A.P.

 

 

 

Ficha Técnica

Segundo Proposta

JORGE LISTOPAD E ORLANDO NEVES

Diz-nos a imprensa a respeito deste ciclo, anunciado em conferência de imprensa:

 

Frei Luís de Sousa, não obrigatório, mas com prazer!” – o slogan foi lançado por Jorge Listopad, na tarde primaveril da última quinta-feira. Assim se anunciava, no aconchego do bar do CAM da Fundação Gulbenkian, o ciclo “Retorno à Tragédia”, que se iniciará em Maio, sob os favoráveis auspícios da Animação, Criatividade e Educação – que foi para isso que se criou o ACARTE. […] Frei Luís, primeiro amor […] Nuno Carinhas desenha cenários e figurinos multimodernamente trágicos; os Telectu compõem electronicamente (“é a primeira vez que se faz teatro em Portugal com música exclusivamente electrónica”, sublinhavam) […] “Claro que poderão dizer-nos que o que estamos a fazer deveria ser feito pelo Teatro Nacional, mas m qualquer sítio que se faça teatro português, com portugueses, está-se a fazer Teatro Nacional…” Todos riram (actores, organizadores, jornalistas), que na tragédia portuguesa há risos fundos como soluços. E um soluço é bem mais engraçado que uma solução.” (I.P., jornal não identificado, arquivo do ACARTE)

 

 

“Duas observações sobre este ciclo Retorno à Tragédia. Não será de o considerar tão audacioso como se quer fazer crer: pense-se na iniciativa de Amélia Rey Colaço/Robles Monteiro que apresentaram em 1943 duas encenações diferentes (uma clássica, outra moderna) de “Frei Luís de Sousa” em dias alternados. Chamar a este ciclo O Anel Português, evocando Wagner, parece-me tão provinciano como chamar a Coimbra Lusa-Atenas ou Aveiro Veneza portuguesa. Será um destino irremediável, este nosso provincianismo? […] Listopad tem a feliz mania de transformar os espaços que investe. Com Nuno Carinhas subverteu os valores, tão débeis, do espaço do CAM (…) Ao lado dele [Carlos Wallenstein], uma jovem, Alexandra Lencastre, uma passagem desde já inesquecível […]. (Carlos Porto, Diário de Lisboa, 20-5-1986)

 

 

“A Fundação Gulbenkian vai promover uma autêntica estreia no nosso meio cultural: a tragédia portuguesa. […] Projecto que visa, também, um objectivo muito concreto e sublinhado pelos responsáveis: o pedagógico. […] Carlos Wallenstein […] acrescentou: […] “Passamos a vida a fazer um teatro ao gosto do público sobretudo comédia e drama”. Mas, o público gostará da tragédia? Uma resposta que só pode ser conhecida após a subida do pano. […]” (O Século, 6-5-1986)

 

 

“ “Tenho muita esperança que este projecto seja uma marca na vida cultural portuguesa”, disse Madalena Azeredo Perdigão, no decorrer de uma conferência de imprensa de apresentação do ciclo “Retorno à Tragédia” […].” (jornal não identificado, arquivo do ACARTE)

 

 

“ […] Mas em termos teatrais a expectativa maior é criada pela encenação de “O Fim” de António Patrício e pela primeira representação de “O Indesejado”, de Jorge de Sena. Trata-se de dois importantes textos dramáticos deste século que apresentam entre si semelhanças, particularmente evidentes no modo como terminam. […]” (Francisco Vale, jornal  não identificado, arquivo do ACARTE)

 

 

“[…] Na sua comunicação improvisada, um dos responsáveis pelo ciclo [Retorno à Tragédia], fez uma crítica do visual gráfico desse folheto [distribuído na conferência de imprensa], por ser triste, cinzento e enevoado. Quando, disse, o que se pretende é o contrário: nada de tristezas, nada de academismos, tudo contra o sebastianismo. Trata-se do prazer da tragédia; não de espectáculos lacrimosos mas de uma afirmação de vitalidade, de prazer. Antes de Listopad falara a directora do CAM, dra. Madalena Perdigão, que se referiu às características gerais do ciclo Retorno à Tragédia e do esforço que representa: seis meses de trabalho. Sublinhou o facto de os autores serem unicamente nacionais, o que foi decisivo no apoio por parte do CAM à sua realização. Na sua opinião, trata-se de uma aposta difícil com um projecto difícil que previsivelmente não terá o apoio de grandes camadas de espectadores. […]” (Diário de Lisboa, 9-5-1986)

“ […] como primeira manifestação paralela em relação ao “Retorno da Tragédia”decorre uma exposição documental e iconográfica sob o título de “100 Anos de Tragédia em Portugal” que conta para a sua organização e montagem de um Museu Nacional de Teatro. […] Paralelamente, o ciclo ganha formas corolárias com espectáculos de bailado, concertos, exposição e colóquios, querendo-se que, a todas estas iniciativas, com a colaboração das instituições pedagógicas, esteja também presente a juventude estudante.” […]” (jornal não identificado, arquivo do ACARTE)

 

 

“Durante todo o mês de Agosto, estes espectáculos [do ciclo Retorno à Tragédia] funcionarão em alternância, possibilitando a existência, rara entre nós, de um verdadeiro teatro de reportório. Para Jorge Listopad, através da tragédia exprime-se sobremaneira uma filosofia de vida, uma determinada visão do mundo que, no tecido nacional em que nos encontramos mergulhados, muito tem a ver com a consciência que as pessoas têm da portugalidade. E afirma: “[…] Enquanto a tragédia grega formou um povo e uma nação cujos valores e crenças mais profundas a entornaram por sua vez, a tragédia portuguesa é acima de tudo um comentário criativo. Torna-se urgente a revisão de Portugal consigo próprio, o repensar da nossa forma de ver o mundo.” […]” (A Capital, 4-6-1986)

“[…] é feliz iniciativa uma busca da tragédia no teatro português. E tão importantes, didácticas e pedagógicas me parecem, para já, as duas propostas que só lamento não nos serem dadas em espectáculos integrais as peças seleccionadas para as colagens de “À Procura da Tragédia”. […] (Manuela de Azevedo, Diário de Notícias, data ?)

“Em primeiro lugar, eu diria que a iniciativa do CAM a que chamou “Retorno à Tragédia”, não é simplesmente oportuna mas absolutamente necessária no panorama teatral de um país que não tem tradições na matéria, quer escrevendo, quer encenando ou representando. […] Parto, assim, do princípio que não tendo nós um Shakespeare, nem um Racine ou um Cervantes ( pelo menos aquele que escreveu Numancia o teatro-escola não formou actores para representar tragédia. Estou a recordar-me do desabafo de um encenador britânico que veio a Lisboa ensaiar Shakespeare, arrepelando-se porque os actores que ensaiava não sabiam o abecedário da arte de representar tragédia. E o actores, então, eram os melhores que tínhamos, os do Teatro Nacional…

[…] E são esses mesmos circunstancialismos que tornam mais evidente a necessidade de se fazer um levantamento do que escrevemos (trabalho meritório de Luís Francisco Rebelo, vindo aliás, na sequência de outras pesquisas já feitas) e, também, da forma possível de através dessa pesquisa, se fazer um não menos possível levantamento plástico e estilístico de representação actual. Penso, pois, que é de aplaudir o grande significado da série de espectáculos – e outros actos – um curso na sala polivalente do CAM, dirigido com tacto (oportunidade e entusiasmo) por MAP. […] Ao contrário do que escrevia Jouvancy, o teatro não devia ser, para os portugueses pouco cultos, um frio deleite intelectual de pessoas instruídas – mas um verdadeiro divertimento, em que participasse, chorando ou rindo… […] (Manuela de Azevedo, Diário de Notícias, 11-6-1986)

“Da notabilíssima série de actividades teatrais que o ACARTE da Gulbenkian promoveu no CAM, sob a designação de Retorno à Tragédia […], foram aqui dadas notícias pelos competentes especialistas de teatro, dança e música.  À chamada “música de cena”, fora capitais momentos notórios, é geralmente concedido que a melhor é a que se não nota – como tantas vezes tem sido dito para o cinema. […] A música no teatro, mesmo só reduzida a música de cena, é um mundo que aguarda o seu historiador e crítico exaustivo. […] (José Blanc de Portugal, Diário de Notícias, 6-9-1986)

 

 

“De longe o mais ambicioso projecto levado à cena nesta temporada foi o ciclo “Retorno à Tragédia”, concebido como o “Anel Português”. […] Jorge Listopad, vindo da Europa Central, é um aportuguesado (ao contrário de nós que somos todos mais ou menos estrangeirados) [… ] Nuno Carinhas é um verdadeiro “designer” teatral na medida em que transcreve em termos plásticos as ideias do encenador. […] Jorge Listopad Reuniu uma série de jovens talentos – Guilherme Filipe, Miguel Menezes, Luísa Cruz, Isabel Alarcão e Maria João Mendes. A actuação mais espectacular foi a de Alexandra Lencastre, em Maria de Noronha, que é muito mais do que uma revelação. […] (Manuel Rio-Carvalho, Jornal de Notícias, data não identificada)